IDAS E VINDAS
Da série:
Pequenas crônicas do cotidiano/2011
fotos do autor
A cena repetia-se constantemente.Deixavam o acostamento e,alheios ao movimento intenso da rodovia,dobravam a esquina adentrando à ruazinha de pedras irregulares ao lado da casa onde moro.
Como era patrão de mim mesmo,dava-me ao luxo de executar minhas tarefas de frente para uma janela,num anexo à minha residência.
Seria uma janela indiscreta (não fôsse êste que vos escreve,um sujeito extremamente discreto),uma vez que a partir de suas formas retangulares,sempre escancaradas,visualizava-se de tudo.
Das magnólias rosadas (que resistiram às ondas de frio),às máquinas barulhentas da distribuidora de areia.Dos frenéticos vai e vem de veículos pela BR,ao não menos frenético vai e vem da vizinhança (tôda catalogada) e as caras novas passíveis ainda de futuras catalogações.Gente boa de prosa,à quem concedia-me o direito de ligeiras abordagens à chatos de galocha à quem arranjava sempre um jeitinho de camuflar minha estampa como forma de prevenir-me de possíveis xaropadas.
Em meio ao burburinho,geralmente na parte da tarde,feito personagens surreais surgia o casal de carroceiros.
Ela,aparentando ser um pouco mais velha que o parceiro,era clara, cabelos louros e um rosto rechonchudo.Vestia sempre roupas muito coloridas.
Êle , moreno,ar enfesado,sempre de chapéu e usando botas de cano longo que deixava bem visíveis no apoio dos pés na parte frontal da carroça.
Os cavalos,brancos,apesar de bem cuidados aparentavam um “não sei quê” de abandono.Puxavam resignadamente a carroça cujas rodas de ferro, substituídas por pneus de automóveis,não produziam aquêle ruído característico .
A carga era sempre a mesma:Lenha cortada.Cruzavam a minha rua com destinos variados,sempre seguidos por dois vira latas de porte médio a desfilar a intrigante felicidade de cachorro de pobre quando aparece a chance de acompanhar o dono.
Dependendo da ocasião,o humor dos carroceiros insitava-lhes à alguns acenos em minha direção,aos quais eu correspondia amistosamente.Noutras,a comitiva passava de olhares fixos num ponto qualquer como se os animais , estropiados, estivessem à tomar o rumo do céu, conduzindo um carregamento de pedras...Nestas ocasiões minha estampa na janela sequer era observada.
Ignorado numa certa tarde,decidi captá-los num click.O fiz no exato momento em que contornavam a rua paralela àquela em que moro. Captei-os , rumo à “Deus sabe onde!”,seguidos da vadiagem e cumplicidade dos seus dois cachorros .
A tarde era de uma doce pasmaceira.Um convite à um bocejo,um cafesinho com biscoitos e um novo olhar pela janela,até que a “carroça de todos os dias” retomasse uma vez mais a minha sonolenta ruazinha de pedras.
Joel Gomes Teixeira
Da série:
Pequenas crônicas do cotidiano/2011
fotos do autor
A cena repetia-se constantemente.Deixavam o acostamento e,alheios ao movimento intenso da rodovia,dobravam a esquina adentrando à ruazinha de pedras irregulares ao lado da casa onde moro.
Como era patrão de mim mesmo,dava-me ao luxo de executar minhas tarefas de frente para uma janela,num anexo à minha residência.
Seria uma janela indiscreta (não fôsse êste que vos escreve,um sujeito extremamente discreto),uma vez que a partir de suas formas retangulares,sempre escancaradas,visualizava-se de tudo.
Das magnólias rosadas (que resistiram às ondas de frio),às máquinas barulhentas da distribuidora de areia.Dos frenéticos vai e vem de veículos pela BR,ao não menos frenético vai e vem da vizinhança (tôda catalogada) e as caras novas passíveis ainda de futuras catalogações.Gente boa de prosa,à quem concedia-me o direito de ligeiras abordagens à chatos de galocha à quem arranjava sempre um jeitinho de camuflar minha estampa como forma de prevenir-me de possíveis xaropadas.
Em meio ao burburinho,geralmente na parte da tarde,feito personagens surreais surgia o casal de carroceiros.
Ela,aparentando ser um pouco mais velha que o parceiro,era clara, cabelos louros e um rosto rechonchudo.Vestia sempre roupas muito coloridas.
Êle , moreno,ar enfesado,sempre de chapéu e usando botas de cano longo que deixava bem visíveis no apoio dos pés na parte frontal da carroça.
Os cavalos,brancos,apesar de bem cuidados aparentavam um “não sei quê” de abandono.Puxavam resignadamente a carroça cujas rodas de ferro, substituídas por pneus de automóveis,não produziam aquêle ruído característico .
A carga era sempre a mesma:Lenha cortada.Cruzavam a minha rua com destinos variados,sempre seguidos por dois vira latas de porte médio a desfilar a intrigante felicidade de cachorro de pobre quando aparece a chance de acompanhar o dono.
Dependendo da ocasião,o humor dos carroceiros insitava-lhes à alguns acenos em minha direção,aos quais eu correspondia amistosamente.Noutras,a comitiva passava de olhares fixos num ponto qualquer como se os animais , estropiados, estivessem à tomar o rumo do céu, conduzindo um carregamento de pedras...Nestas ocasiões minha estampa na janela sequer era observada.
Ignorado numa certa tarde,decidi captá-los num click.O fiz no exato momento em que contornavam a rua paralela àquela em que moro. Captei-os , rumo à “Deus sabe onde!”,seguidos da vadiagem e cumplicidade dos seus dois cachorros .
A tarde era de uma doce pasmaceira.Um convite à um bocejo,um cafesinho com biscoitos e um novo olhar pela janela,até que a “carroça de todos os dias” retomasse uma vez mais a minha sonolenta ruazinha de pedras.
Joel Gomes Teixeira