Ó, MEU BRAZIL

Noite dessas me meti a ler uma crônica sobre o sertão. Tinha uma idéia vaga desse “troço”, um pouco de Glauber Rocha, um pouco da TV Globo e outro tanto dos estereótipos preconceituosos das estórias que os paulistas contam. Uma pitada de Guimarães Rosa, outra de Euclides da Cunha acrescido de Ferreira Gular. Os jornais daqui também não colaboram. A sêca já deixou de ser notícia, afinal não é nada moderno falar de coisas medievais. E convenhamos, esta sêca já é pra lá de medieval. Afinal, o país já é daqueles ditos emergentes, sua juventude se delicia com traquitanas eletrônicas e TV à cabo. Ora, como explicar algo que já deveria de estar resolvido. Como continuar a falar de um assunto tão ou mais batido do que a própria terra do sertão. De mais a mais a MPB e seus intérpretes quase transformaram a “coisa” em poesia. E poesia, caros leitores, é o que move o mundo. Dizem por estas bandas, cá no sul, que a tal da sêca é um grande negócio, que muitos auferem tremendos lucros com isso e outros tantos se locupletam. Nada mais fácil de acreditar caso o leitor queira fazer a soma dos representantes do povo, os nossos deputados e senadores, oriundos dos estados do norte e do nordeste do Brasil. É uma conta fácil de ser feita, bastando somar. O resultado será um inacreditável número de pessoas que deveriam de estar comprometidas apenas com as suas bases eleitorais e, portanto, com a tal da sêca. Ora, até o presidente é daquelas bandas e no que foi que deu? Deu em nada. Como aliás parece ser a labuta do sertanejo. Acaba que dá em nada. Qualquer dia desses o governo resolve e decreta que o sertanejo deixou de existir, assim, não mais precisará correr em seu auxílio. Não é difícil de imaginar, afinal, outro dia, o IBGE divulgou estatísticas revelando que nos últimos quarenta anos o Brasil deixou de ser rural e virou urbano. Parece que só falta declarar a inexistência de qualquer área habitada no sertão. Neste dia nossas consciências, em regozijo, declararão que o sertão e a sêca são pura poesia. Não tardará o dia em que o assunto só será debatido em saraus literários ou em cadernos culturais de algum jornal. E nosso governo poderá emitir nota oficial de que “nunca, na história desse país, se fez tanto”. Daí, os juros internacionais poderão ser pagos sem remela, sem calo e sem as faces de pele carcomida pela lida no campo. Para festejar, com o comprovante de pagamento em mãos, todos seremos convidados para um café na Daslu com música de Antônio Nobrega, Chico Cience e Gonzagão. Tudo na voz de Elba que, no intervalo do “pocket show”, anunciará que o Brasil já é dos maiores mercados de consumo de luxo do planeta. Igualzinho fez o jornal Folha de São Paulo, ontem. “Aquele abraço”!