Essa Coisa Estranha

Eram umas 23:36 hs em terra de Ferreira Gullar, ouvindo uma versão em inglês do Trem Azul de Lô Borges um dos grandes do clube da esquina, pois bem, a versão na voz do maestro Tom Jobim – brasileiro de todos os tempos que canta o verde, músico ambientalista e puramente brasileiro – fez-me lembrar de meu pupilo, sim, meu querido que chegou quietinho, tosco ao andar, chamando mamãe e o meu nome, depois papai, e, carinhosamente em diminutivo quando da intenção de algo pedir, meu Lucas que tanto quero bem.

Sair umas poucas horas de casa, em algum tempo considero ruim por demais, ficar dias fora de casa já me aperta o peito, primeiro de saudade, depois solidão tamanha num apartamento do décimo quarto andar de uma vista verde escura e de pontinhos luminosos bem distantes, noutro lado apenas demais prédios e suas janelas perigosamente abertas com imagem de TV e gente na varanda tomando o seu néctar noturno com aparência de uísque, eu via somente vultos. A música prossegue com aquele ambiente indesejável de hora não corrida no relógio, de tempo não contado, mas o tempo não para, ele é implacável e nunca usa de misericórdia pra seu ninguém, mas é algo sublime.

Saudades do pupilo e de minha querida que tanto me faz falta, mas a questão estranha não é tanto pela saudade, tem algo no ar que me deixa em total desconforto – solidão. Tem muito gente que exprime medo dessa tal estranha que entra sem pedir licença, é toda vida assim, não sabe dizer, nem pergunta algo e tão pouco ela se incomoda se você tá bem ou ruim das pernas, essa coisa que chamamos de solidão, ela é cruel e me deixa com espasmos de medo, por mais que poucas vezes, essa estranha indesejável que, a partir desse momento, tornou-se para mim um comparte da alma, toda vez que me sinto só, sinto-me estranhamento visitado e passei a gostar. Em São Luiz e por três dias, por nada vi, mas nada mesmo, nem Litorânea nenhuma, nem centro histórico nenhum. A orla? Nada. O teatro Arthur Azevedo? Putz! A catedral dos antigos jesuítas? Casa do Nhozinho, Casa das Tulhas em tempos de século 19? E as praias – Ponta d’Areia, Calhau e outras? Nada.

De outra sorte, tenho eu a mais bela das companheiras noturnas, durante dia: burocracias passageiras, papeladas e planilhas várias e alguns blá, blá blás; pela noite: clausura, se monástica não sei, o que sei é que sozinho eu não fico, tenho um guaraná Jesus e dentre as noites o que me enseja é o que me basta feito uma baba de moca, um alfajor, um mil-folhas e, como não poderia faltar, um estranho doce: Solidão!

Em algum tempo de 2014