Pobre Crônica de Natal

O Bicho

Vi ontem um bicho

Na imundície do pátio

Catando comida

Entre os detritos.

Quando achava alguma coisa

Não examinava,nem cheirava.

Engolia com voracidade.

O bicho não era um cão,

Não era um gato,

Não era um rato.

O bicho,meu Deus,era um homem!

(Manuel Bandeira)

(Uma folha de papel me chama a atenção!Colocada aleatoriamente sobre um aparador,este poema!)

Depois de ler e refletir, sabem o que senti,nesta noite natalina?Somente incredulidade passageira!Vou continuar festejando meu Natal colorido,iluminado por luzes,mesa farta e lindos presentes.No meu"LAR,DOCE LAR",blindo meu olhar para aquela leitura surreal que se descortinou através desses versos, afinal tenho o direito de desfrutar do bom e do melhor:pago meus impostos!Por isso,posso!

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Após a ceia,(deliciosa por sinal!)a imagem do homem-bicho,do poema lido, veio à mente novamente, e intensamente.Afasto a cortina,vagarosamente, e percebo que o protagonista da desumana cena poética, está ali,muito próximo.Saiu do poema,tornou-se real!É uma criança?Já é um homem?Que importa!Importa sim afirmar que a palavra ESPERANÇA, certamente, não lhe é familiar, não faz parte do seu vocabulário diário.Talvez se perguntasse...ou não:Por que nem todos têm o direito de festejar o Natal?Deus-Menino não nasceu para todos?Como sobreviver neste mundo cão?Isto se chama vida?...Perguntas sem respostas!

Só sei que para este homem-bicho não há escolhas...Lixo é LUXO!

Paradoxal este cenário:enquanto alguns desviam fortunas,banham-se em piscinas de farturas,ali,diante dos meus olhos incrédulos,o homem-bicho procura sua sobrevivência no lixo...Mexe...Remexe.Nesta selva de pedra em que vivemos,as fronteiras parecem ser de concreto.Para muitos não há brechas para raios de SOL,nem sonhos com campos floridos de girassóis!As palavras IGUALDADE e HUMANIDADE, os homens-bichos, desconhecem-nas e ponto.

P.S.Se porventura,algum privilegiado cidadão jogar no lixo,sobras de comida natalina,embrulhe-as,cuidadosamente,se possível,carinhosamente.Estes restos serão o almoço pós-Natal deste Homem-bicho!Homem-Irmão!(Impossível se esquecer da máxima,neste momento:"Perante DEUS somos todos IRMÃOS!")Quanta HIPOCRISIA,não?E HIPOCRISIA jamais rimará com ESPERANÇA.HIPOCRISIA, rima sim, com o Homem-bicho-criança,ali,muito perto,embaixo da minha janela.Era uma vez...uma real e dolorida, NOITE de NATAL!

FELIZ NATAL,AMIGOS!

Amanhã outro dia!E em muitos outros lixos,outros homens-bicho-criança continuarão sentindo fome e engolindo com voracidade os nossos restos que encontrarem entre os dejetos.E a vida, mesmo assim,com ambição desmedida...continuará.E pensar que Manuel Bandeira já avistara essa cena há longo tempo,e continuamos a visualizá-la em pleno século XXI.

Quem sabe um dia possamos escrever crônicas com sabor de um RICO NATAL...Mais Humano para TODOS!Afinal,a palavra ES-PE-RAN-ÇA existe pra quê?

HO!HO!HO!

FELIZ NATAL!

Mar Busato
Enviado por Mar Busato em 02/01/2017
Reeditado em 01/02/2017
Código do texto: T5869571
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