À MEMÓRIA DE PADRE ALÍPIO
Padre Alípio foi um amigo e mestre para mim. Eu nem pensava em cantar quando conheci Padre Alípio, em Boa Vista, Russas. Lembro-me que foi numa noitada de cantoria em Boa Vista que conheci de perto Padre Alípio Santiago; daí passamos a conversar em literatura e filosofia, história geral e nos problemas brasileiros. Os nossos assuntos sempre foram literários filosóficos e nunca teológicos. Não tinha graça um ateu como eu discutir teologia com um sábio da igreja. Padre Alípio era um homem sensível, um sábio equilibrado em todo assunto humano. Quando eu falava uma palavra errada ele me corrigia com toda a simplicidade de um homem culto, erudito e sincero. Não tinha arrogância e nem exibia pedantismo no seu corrigir amigo e sempre disse: É lendo que se escreve bem. Uma vez me determinei a escrever um verso e mostrar a ele, esperando o seu aval. No momento ele nada me disse sobre o meu verso; porém três dias depois ele me dava aprovação da minha poesia, dizendo que eu apenas tinha rimado sem nenhum sentido, fiquei triste. Logo me veio o elogio autêntico de que se eu praticasse, futuramente eu iria escrever muita coisa boa, pois eu tinha um bom talento ainda para desenvolver. Padre Alípio era um homem sem maldade, era um cidadão altruísta e despido de orgulho. Em qualquer lugar que a gente se encontrava, a gente tinha tempo para falar de gramática, para falar de literatura, ou outro qualquer assunto de nosso interesse. Quando eu acabava de ler um romance brasileiro, ele me perguntava quem melhor: Machado de Assis ou Eça de Queirós. Eu ficava enfatuado porque não sabia responder qual o melhor e por que melhor. Carrego dentro de mim a lembrança deste amigo, deste mestre, deste pároco que já se foi. Talvez a posteridade venha conhecer bem melhor a nossa amizade do que a geração atual. Padre Alípio não fez poema, não fez soneto, não poetou de maneira alguma; mas merece ser poetizado por quem foi seu amigo, por quem o conheceu de perto. O seu nome e o meu ficarão em letras de fôrmas para o porvir nos conhecer de verdade. Não tenho nada melhor do que esta crônica para lhe oferecer em troca de todo o nosso afeto de amigos sinceros. Se nesta crônica não houver sinceridade, então a nossa amizade foi falha. O primeiro romance que li do começo ao fim, foi Ressurreição de Machado de Assis, doado por este grande amigo e mestre, o saudoso Padre Alípio. Antes de começar a leitura, ele me disse que eu lesse a biografia do genial escritor e prestasse atenção como tinha começado a escrever o grande romancista brasileiro. Depois que li a biografia, ele perguntou-me o que eu tinha achado de interessante. Então eu respondi: Machado não tinha formação. Ele me respondeu: e você será assim também. Três pessoas marcaram a minha vida de repentista popular e literato paupérrimo. A primeira foi a Tia Marica, a segunda foi Padre Alípio e a terceira Antônio Gilmar de Oliveira, o Professor Gilmar.