Uma aquarela para o outono

Tenho trinta anos e uma constatação: irei morrer! Não que eu esteja doente, encrencado ou algo assim, nada disso. Apenas me caiu a ficha de uma realidade tão certa quanto indesejada, numa boa expectativa, lá se foi bem um terço de meus anos, aproveitados, ou não, ao bel prazer de minhas (des)venturas.

O desconfortante de minha digamos, constatação é a certeza de algo que de tão certo até parece incerto. Explico: sabemos que algum dia, morreremos, verificamos isso ainda na pueril infância quanto nos dizem que o papai do céu levou aquele titio tão próximo que sempre trazia balas, contava as melhores piadas e nos levava ao parque para brincarmos no playground para depois tomarmos um delicioso sorvete napolitano, ou avô carinhoso que fazia todas as nossas vontades, contava boas histórias, e era cumplice de nossas traquinagens infantis, entre outros entes que tanto amamos e que de repente, já não estão mais entre nós, e nem sequer mandam uma única lembrança que seja. A gente fica imaginado como será que eles vivem lá no céu, sempre tive um pouco de receio de saber como será o céu, e vai que ele não exista?

Já eu e você que existimos em carne, osso e com prazo de validade, mesmo que desconhecido, somos consumidos pelo tempo que determina mais hora menos hora o limite de nossa duração. Se bem que uma data de vencimento não é lá tão ruim assim, imagine como seria o mundo se todos fossem eternos..., pois é, fica até difícil de imaginá-lo com tanta gente assim.

Tudo bem, alguém diria, é a lei da vida, tudo que nasce, morre e é assim desde que o mundo é mundo, mas o fato de não saber aonde ir após o fatídico resfriar do corpo é que certamente, com o perdão da analogia, o que me dá o maior gelo. Talvez seja isso, impossibilitados pela certeza de nossas limitações nos inquietamos diante das perguntas sem respostas, se é que elas precisam de alguma resposta? Outra dúvida.

Semelhante constatação nos dá uma dimensão da nossa fragilidade e impossibilidade ante o fim que nos aguarda, terei eu chance de um último pedido antes do derradeiro apagar das luzes? Este é um texto permeado pela dúvida.

Enfim, tenho trinta anos cumpridos, se cumprirei outros trinta não sei, talvez seja o momento de pensar mais na qualidade ao invés da quantidade de tempo que ainda resta, novamente, se é que me resta? Destino é uma coisa inexorável. Descobrir algumas respostas faz parte do aprendizado, porém, reconhecer a inegável eminência da dúvida, me parece, é sinal de grande sabedoria, já que sem ela não apelaríamos para a imaginação, aquarela da vida, na qual pintamos dos mais variados tons todo o seu percurso inclusive o que vem a ser o derradeiro, o desfecho, o fim, no mais e até lá é seguir pintando, mesmo que seja o sete.