Volta

Durante sete anos da minha vida passei em formação rumo a vida religiosa consagrada. Entrei em um centro de orientação vocacional na Cidade de Marituba-PA, com uma vontade sem tamanho de ser padre. Na linguagem comum, “seminário”. Depois fui para a cidade de Viamão-RS para dar início no curso de filosofia. Ainda morei em Porto Alegre e na bela serra Gaúcha na aconchegante cidade de Farroupilha-RS. Talvez você esteja se perguntando, qual a relevância dessas informações? Explico-me:

Nesses anos de experiência missionária religiosa e de profundos pensamentos filosóficos e teológicos, meu pai sempre me dizia: na hora em quiseres voltar para casa as portas estarão sempre abertas, pode voltar. Voltar...para onde?! Se estou no seminário não voltarei para casa, mas irei para casa! Primeiro que já não serei o mesmo, nem minha casa e tão pouco os meus pais. Nunca, dizia o filósofo Heráclito, nos banhamos duas vezes no mesmo rio, porque nem nós e nem o rio somos mais os mesmos. Ou ainda como canta Lulu Santos, “nada do que foi será do jeito que já foi um dia”. O pêndulo do relógio não fica indo e voltando, ele está sempre indo. O ponteiro não fica dando voltas, sempre vai.

Os casais se separam e depois querem voltar, mal sabem que o tempo não volta. O tempo muda os sentimentos, as pessoas mudam, as fantasias são desfeitas. As relações não têm volta, tem continuidade. Assim também é com a vida, ela sempre vai. Podemos voltar atrás? Acredito que não. Isso parece triste, não podemos errar então? Errar podemos, assim como também podemos fazer com que o erro nos ensine e nos fortaleça para prosseguir mais forte e melhores.

Quando pedir para sair do seminário meus superiores me diziam, agora você precisa recomeçar a vida, eu me perguntava: por um acaso dei uma pausa na vida durante a estadia no “seminário”? Não. Não preciso recomeçar a vida, preciso mesmo é dar continuidade. Não estava voltando para casa, estava indo. Recomeçar é voltar do começo. A vida tem começos e fins, o meio estar no vivido. Viemos do começo e sempre caminhamos no fim. Mas não há porque o desespero, o medo. O fim está aí, e por isso que é preciso sempre abrir caminhos. O segredo da vida estar em abrir caminhos. Abrir caminhos no trabalho, na família, nas relações pessoais e interpessoais.

A pessoa humana gosta do desafio, do que é impossível. Voltar é um deles. E parece que há em nós uma vontade de “voltar”, com um olhar no futuro. Temos um desejo inconsciente de voltar para o aconchego do útero. Afinal, quem não gosta de um aconchego, de um lugar quentinho, protegido, que não falte nada? As vezes confundimos isso e procuramos no dinheiro, sim, ledo engano. Conforto financeiro, casa boa, investimento em segurança, etc. Outros mais no paraíso, nada melhor que essa imagem reflete bem esse desejo. Alcançar o paraíso depois dessa vida. E aqui dispenso comentários.

Assis Silva
Enviado por Assis Silva em 14/12/2016
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