As Neuras e outras Coisas
— Você ouviu que eu acabei de espirrar! – Disse ela.
— Sim, ouvi! – respondeu ele olhando pela janela.
— É só isso?
— Como assim Isa?
— Como assim que quando aquela peito de silicone estava aqui no domingo, eu ouvi você dizendo “Saúde” quando ela espirrou!
— Não sei do que você está falando! – Respondeu girando levemente a cabeça para a mulher que espanava o sofá.
— Sabe não né? Mas eu sei, aquela rapariga vendedora de perfumes que vem com aquele pedaço de saia merece você dizer saúde quando espirra! Enquanto eu posso sofrer um ataque de espirros que você finge que não escuta!
— Por mim, a irmã é sua! – Falou retornando a observar a rua através da janela.
— Só sirvo para empregada de todo mundo mesmo e, sei que vou carregar a sina eterna de ouvir certas coisas e fingir-me de surda, ver gente safada olhando para bundas de piriguetes na minha frente e fingir que não vi! Você tem que dizer é assim mesmo! Por mim! A irmã é minha, mas nem por isso você deve ser grosso comigo está bom?!
— Isa, se você não quer ficar na boa, Vou sair para desintoxicar minha cabeça! Fique com suas neuras!
— Fico sim Luiz Antonio, fico com todas as minhas neuras, minha casa para arrumar, minha comida para fazer, minhas crianças para dar banho e meus espirros para ninguém dizer saúde!
— Posso ao menos voltar ao quarto para pegar minha roupa!
— Por que não sai de cuecas?
Do quarto Luiz Antonio apanhou as roupas e correu para os fundos da casa. Ruído de automóvel e crianças gritando, Isa foi ao encontro deles, abraçou as crianças e recebeu do homem vários embrulhos em papeis de presente. Dentro de casa as compras se esparramaram pelo chão.
— Pensei em todo mundo, o seu presente é este! Este aqui é para sua mãe, estes menores são para sorteamos aos convidados na hora da ceia! Neste natal não nos esqueceremos de ninguém! – Exclamou o homem beijando o rosto da esposa.
— Mas e aquele embrulho grande ali! – Questionou Isa.
— É Para presentearmos a sua irmã! Aliás, ela e o namorado.
— Que namorado que aquela peito de silicone tem?
Antes que respondesse a mulher, um dos filhos veio correndo dizer ao pai que tinha um homem em cima da Amendoeira. Com uma arma na mão saiu em disparada para os fundos da casa. A mulher sabendo de quem se tratava tentava conter o marido. Mas não conseguiu.
— Luiz Antonio o que é que você está fazendo de ai em cima seu porra!?
Isa raciocinou mais rápido para contornar a situação.
— Ai meu Deus! Senhor Luiz me perdoe! Amor imagina que um gatinho miava lá em cima e eu sem coragem de subir, fui até a rua e olha a coincidência, Seu Luiz passava na hora. Eu pedi o favor a ele e me esqueci.
— Mas então cadê o gato? – Quis saber o marido.
— É, É, esta é a minha segunda subida. Eu salvei o gatinho, quando ele correu subi para ver se pegava um Bem-Te-Vi que chegou depois. – Concluiu gaguejando.
— Pois é Luiz Antonio, o gatinho te livrou de comer chumbo pelo rabo. Por um instante pensei que sua despedida seria aqui! – Falou apontando o revolver em direção as nádegas dele.
— É amor, mas já está tudo entendido né! – Argumentou a mulher empurrando a arma.
— Sim inclusive, ele até precisa saber do presente que comprei para eles!
— Eles quem? Você falou da minha irmã e o namorado!
— Sim, fala baixo que é surpresa! – Disse o marido em tom de cochicho puxando a mulher para o lado.
— Como assim surpresa homem, do que você está falando?
— Preste atenção, Luiz Antonio mantinha um romance secreto com a sua irmã, segundo sua mãe faz alguns anos. Agora os dois querem botar alianças de compromisso, domingo aqui em casa era o almoço de aproximação, mas os dois brigaram e não disseram a ninguém!
Isa estava em choque, olhava para o marido e para o amante que descia vagarosamente da árvore.
— E tem mais, não conte a sua irmã! – Sorriu ele.
— O cara é tão safado que disse a mim ontem que hoje se despediria de uma vadia que ele come aqui na rua. Por isso se não fosse pelo Gato eu pensaria que era o corno e você a vadia.
— Amor, mas preciso te falar uma coisa sobre ele!
— Falar o quê Isa! Olha lá hein, você me conhece! Vociferou o homem apertando a arma contra a barriga mulher.
— É que quando eu pedi o favor, ele passou a mão em mim!
— Safada e só agora você me conta!
— Eu ia contar quando ele descesse!
— O que mais que ele fez?
— Mais nada. Só passou a mão aqui em baixo e enfiou o dedo!
— Desgraçado, filha-da-puta! Toma e toma!
Foram dois tiros certeiros. Luiz Antonio enganchou-se na ultima galha, o sangue da sua cabeça pingava no chão feito goteiras. Em um misto de choro e riso Isa espirrou, se abraçando ao marido.
— Diz saúde para mim amor!
— Saúde. – Disse involuntariamente.