A ENIGMÁTICA CARTA NA MANGA

Na reunião mensal da empresa, o diretor de captação Olímpio Lopes Sobrinho descobriu que o recém contratado Ciro Siqueira foi o único funcionário a não atingir as metas estabelecidas.

Após determinar as novas exigências, Olímpio deu a reunião por encerrada e pediu para que Siqueira permanecesse na sala.

- Era para você nos trazer 300 novos clientes, só conseguiu 250. No primeiro mês lhe demos uma meta singela, apenas 100 clientes, e você nos trouxe 200. Ficamos surpreendidos com sua desenvoltura. Parece que nossa alegria durou pouco... Para o próximo mês a sua meta será 400.

- Trarei 300, senhor Olímpio.

- Então é você quem dá as ordens aqui?

- Ordens, não! Mas as metas, sim!

- Pode explicar melhor?

- Senhor Olímpio, serão 300 novos clientes simplesmente porque tenho uma carta na manga. E é bom o senhor ficar ciente disso logo de uma vez para saber como administrar; caso contrário, nada será como agora está sendo. Até o mês que vem, senhor.

- Era só o que faltava, pensou Olímpio. Funcionário que mal acaba de chegar determinando suas próprias metas. Uma carta na manga!

Mas a convicção com que Ciro dissera aquilo... Com olhar ora ameaçador, ora piedoso...

Será que ele sabe sobre a amante? Problemas que andava enfrentando com a polícia e o filho? A maneira como sua princesinha ‘passou’ no vestibular de Medicina? Sobre a herança que ele solucionou sem que suas cunhadas e sogra desconfiassem? Mas isso eram coisas que só ele sabia. Não. E Ciro não era canalha. A empresa é muito criteriosa nesse quesito.

Quem sabe aquela retirada (extra) para passar uns dias com a esposa em um resort na Bahia há dois anos. Esposa... Por uma ou duas vezes (ou seria mais?) - flagrou seu chefe e sua amada trocando olhares singelos nas festas da empresa... Deus! O que Ciro sabe que ele não sabia?

E assim se passaram alguns anos com Ciro determinando o ‘quanto’ fazer.

Duas décadas depois, aposentado e se dedicando as complicadas operações da Bolsa de Valores, Olímpio descobriu onde seu ex-subordinado trabalhava e foi lhe visitar.

E Ciro, executivo de uma montadora de automóveis com sede em Detroit, o recebeu em uma sala ampla e requintada. Mal se deu 10 minutos de conversa animada e eis que adentra a secretária – com pedido de licença, com uma indagação.

- Detroit está solicitando sua presença na reunião de janeiro. Posso confirmar ‘doutor’ Ciro?

- Não. Não irei. E se questionarem, simplesmente diga que eu tenho uma carta na manga. UMA CARTA NA MANGA. Entendeu? Eles sabem do que se trata.

Olímpio consultou seu relógio e alegando outros compromissos deu por encerrada a visita. Uma semana depois algumas palavras continuavam em seu pensamento. Detroit... Uma carta na manga... Eles sabem do que se trata...