Montando quebra-cabeças
Era tudo sem recortes, sem encaixes e sem fragmentos.
Quase sempre, e não foi diferente dessa vez, a primeira lasca foi o sonho, mas nem me preocupei com isso, eu já disse uma vez, que até a história da humanidade começou com uma Pedra Lascada.
As fraturas seguintes parece que obedeciam a uma sequência natural: laços, ideais, prazeres lascivos e projetos, desfaziam-se como se desfaz a areia, quando abandona a parte superior da ampulheta, devagar, com ritmo e demarcando o tempo, de forma bem perceptível.
A vida era um espelho, sem trincas, refletindo uma vida inteira; não um espelho de parque de diversão, não engordava, não emagrecia e não deformava, ou seja, não alongava e nem reduzia as imagens, somente refletia a realidade.
Tudo se transformava em pedaços menores, mas a idade era inexorável e ganhava dimensões, não dimensões pretendias, mas dimensões impostas...enormes
Cacos, tudo vai se transformando em cacos, a paisagem vai se desintegrando e deixando a moldura, quase sempre voltando, na saudade, a se reunir, montando uma fotografia grande e oval na parede da sala...reminiscências.
Até que tudo se reagrupe na memória de alguém, vejo-me como fragmentos desmontados em uma vasilha, que ainda se chama vida, que tem na tampa uma figura que foi uma existência. Talvez ninguém acredite, mas meu mundo já foi uma peça inteira...uma vez, há muito tempo atrás, e eu posso jurar, meu mundo já foi inteirinho.