O diabo
Assis Silva
Quando menino ouvia muitos comentários maldosos sobre o diabo, colocavam ele como o pior dos inimigos. Mas me dei conta que quase ninguém o conhecia direito. Julgavam sem o devido conhecimento, talvez culpa da falta de investigação das próprias pessoas. Porém, a culpa mesmo é das convicções, pois como dizia Nietzsche “ a pior das prisões são as convicções”, uma vez provada uma teoria, as investigações tendem a definhar e essa teoria torna-se perigosa.
Certa vez, li um texto de um monge que dizia que o diabo pode ter sido criado por pessoas que se julgavam santas, ou fruto de uma teologia do medo. Deixo de lado por ser longa a reflexão teológica e filosófica sobre essa figura tão temida. Durante minha infância sempre suspeitei dele, mas depois de muito meditar, percebo que ele, mais do que um ser perverso e maldoso, foi meu grande “testador”. Explico-me.
Diabo opõe-se ao simbólico, simbólico é união, diabólico é separação. Quando estamos em situações de penúria, sofrimento, quem é o culpado? O diabo, ou o nosso afastamento de Deus, explicam alguns! Lembrei da novela bíblica de Jó. Em que Deus se reúne com seus anjos, e traz presente a figura de Jó. Vejam como este meu servo é fiel, e como tem grande fé. Mas o diabo diz, calma é claro tu sempre o cerca de cuidados e proteção. Deixa pô-lo em apuros, tirar o que ele tem e aí vamos ver se é realmente teu servo fiel. E assim se fez, o diabo veio e começou seu serviço de provar a fé de Jó. Tirou-lhe riqueza, família, amigos, e até sua saúde. Seria o diabo maldoso, ou um testador das nossas forças e da nossa fé?
Ultimamente passei a pensar em todas as pessoas que me fizeram algum tipo de mal, que me causaram grande sofrimento, me humilharam, ou ainda que me colocaram no fundo do poço da existência. Queria poder chegar para elas e agradecer. Agradecer? Sim, agradecer...afinal, elas não foram, assim como o diabo tão maléficas assim, aliás foram peças que me tornaram fortes, assim como o diabo fez com Jó, e também pra Jesus Cristo quando o levou para o deserto para tenta-lo. Às pessoas que me amam já as agradeço imensamente, pois sustentam e protegem a minha fortificação.
Pensei em uma crônica de Rubens Alves em que ele chama o diabo de testador: “ E me veio a ideia de que o Diabo é o encarregado do controle de qualidade do ser humano (...) aquele que nos faz passar pelo teste, que nos submete ao controle de qualidade para ver, se dentro da bela viola não existe só pão bolorento”. A dor nos desfigura e tira toda a nossa casca. Gosto muito de uma frase magnifica de Nietzsche em ele diz que “o ser humano nu é um vergonhoso espetáculo”. Para o sofrimento queremos dar respostas e achar um culpado, como Deus é infinitamente bom, não pode ser o causador do mal. Então resta a culpa para o testador.