----INSÔNIA----
Súbito, sem quê nem porquê, acordo. Rolo na cama prá lá e pra cá, inverto o travesseiro, cubro-me e descubro-me. Inútil. Corpo e mente recusam-se a adormecer novamente. Olho o relógio do criado-mudo. Quase seis horas! Lembro-me de antigos tempos, em que não era exatamente no lençol e cobertor em que, nas madrugadas, eu me embolava... A cama torna-se insuportável. Levanto-me, abro a janela. Deparo-me com um negror total, habitado pelo silêncio, interrompido por um roncar da noite em um carro que passa...
Uma fria brisa aproveita a brecha, invade o quarto e me enregela. Visto um roupão, volto à janela. Ali permaneço, absorto. Muito lentamente, nuvens cinzas esbranquiçadas vão encobrindo a noite que se esvai. A claridade é tênue, mas dói nos olhos. Não sei quanto tempo ali permaneci, ante um triste amanhecer, sem sol. Alguns pássaros libertam seus cantos. Que tolos! Por que não mais dormem em seus acolhedores ninhos?
Agora pessoas madrugadoras começam a passar, apressadas; ao trabalho, certamente. Não volto à cama. O sono escapara pela janela. A luminosidade aumenta e observo a vizinhança. Alguma janelas já se abrem, aumenta o fluxo de pessoas e carros. Passa um velhinho com um saco de pães...
Mas o sol, onde o sol? Ao contrário de mim, ainda adormecido? O tal velhinho me inspirou a fazer um café. Olho para o relógio constatando a disparada dos ponteiros. Quase sete horas! Quanto tempo fiquei à janela, entre voláteis pensares, com indefinível melancolia...
Sim, já é um novo dia, a vida antecipada. Sinto-me roubado por cordões do tempo manipulados pelos homens.
Ora bolas, horário de verão!!!
_____________________________________________gajocosta