Um certo amigo
É. O meu pai tem toda razão: tudo se deteriora (no vernáculo de meu pai – um cearense culto que nunca foi à escola – a expressão usual é: “tudo se estiola”).
Sou agora testemunha de que ele está com a razão.
Eu, por exemplo, tenho um cabeleireiro e maquiador de minha inteira confiança. Um “faz tudo” na minha vida. Faz tudo mesmo! Olha, ele tá na minha vida desde que me conheço por gente... Inseparável ao pé da letra!
Acontece que, com base na teoria do Seu Jorge, meu velho pai, tudo nessa vida se estiola.
E vem ocorrendo o seguinte:
Um dia percebi que já era hora de dar um trato no visual. Então pedi a ele, ao meu faz-tudo de inteira confiança, pra caprichar na maquiagem.
Ele iniciou os procedimentos calmamente. Fez uns retoques em volta dos olhos, na testa, no pescoço, na boca...
Até aí tudo bem. Depois falou que ia pintar meu cabelo.
– Precisa mesmo?
–Tá na hora –, disse ele. Ainda relutante, confiei na sua sugestão. Mas orientei: Capricha aí, hein!
– Que cor?
– Preto. – Afirmei.
Ele se encarregou de tudo. Só quando não tinha mais jeito é que vi o resultado.
– Que que é isso? – esbravejei. Eu disse PRETO!
Ele calmamente zombou da minha vaidade ferida:
– Agora já foi. Eu entendi PRATA.
Nem vou mais reclamar. Acho que ele anda meio surdo.
Esse meu amigo chama-se Tempo.
Granja Viana/Cotia, 17 de novembro de 2016 – 12h45