Pior é que os mínimos detalhes ficam

Sei disso — ou meu corpo sabe — porque a primeira coisa que meu dedo fez, quando acordei ainda meio tonto de sono e percebi que vestia essa camisa preta, foi tateá-la em busca da falha que causei ainda quando você a usava. Talvez, por uma fração de tempo ele houvesse esquecido de tudo, ou quisesse se lembrar de tudo, ou talvez seja da natureza dos dedos os devaneios. Mas, claro, voltou correndo para a mão como um menino assustado que descobriu a brasa da pior maneira possível. Tomo o meu café tentando não pensar que ele estava do jeitinho que você gostava — forte, que é para “sentir melhor o sabor”. Coloco os fones rezando para que o Belchior não me alucine em nenhuma faixa.

Tentei, juro que tentei, me interessar por outras pessoas. Opostas, desinteressantíssimas. Mas, até a rejeição delas foi indolor. Branco, sempre branco. E ainda tento, você sabe que eu tento, mesmo que fazê-las de quadro, fazer-me gente.

Na rua eu sinto raiva por você usar um desodorante tão comum, sinto raiva das pessoas por se apossarem de algo tão particular, tão íntimo da minha vida. E enjoo. Fisicamente mesmo, sem metáforas. Enjoo até alguém reafirmar que odeia a segunda-feira. Enjoo até lembrar do cheiro de cigarro na ponta dos teus dedos toda segunda, que eu não questionava, nem me importava e me perco olhando para minha mão, especificamente para o ponto exato onde o seu dedo indicador da mão inquieta e suada — entrelaçada com a minha — conseguia atingir. Esse ponto que, se me perguntassem uma semana atrás qual a parte favorita do meu corpo, eu o indicaria. Esse ponto que sabe mais de amor do que qualquer coisa que eu venha escrever.

Quando a energia vai embora, a gente não pensa muito na luz que nos tirava da escuridão, a gente se senta no lugar favorito em que assistia TV, a gente leva a mão ao bolso do celular. E sei que passa, sei que uma hora a energia volta. Estou cansado de ouvir isso da boca dos amigos, dos filmes, de uma simples propaganda comercial. É que para mim, viver é tão novo. Não sei se essa sensação muda algum dia, mas, não consigo viver mais que o presente e não consigo encontrar semelhanças no que já passou.

A noite é mais difícil, é admitir coisas, como fiz ontem, como faço agora enquanto digito esse texto — me lembrando do som frenético do teclado sendo tocado por você, do seu rosto fixo, da desatenção compensada por um sorriso — e como sei que farei amanhã e depois e depois e depois até que não haja nada mais a ser admitido, até que haja, enfim, luz.

E não peguei o celular em nenhum instante. E deito. E durmo. E resisto.

Os bons ficam e os ruins vão embora, quem me dera se fosse o contrário.