O SILICONE AMESTRADO

Vanessa Cristina era uma mulher dinâmica e musculosa, com seu corpinho malhado e entupido por silicone.Andava com o celular pregado na cintura feito um armário embutido e se achava “um luxo” total radiante. Usava tanta maquiagem que mais parecia um Drag Queen e quando abria a boca, simplesmente não falava nada com nada.Não tinha assunto; não tinha pé e nem cabeça.

Quando lhe perguntavam alguma coisa que desconhecia, mascava um chicletinho no canto da boca, fingindo cantarolar em inglês.

Mas que inglês, que nada!O seu verdadeiro nome nem era aquele e isto era um segredo militar.

Poucos conheciam a sua origem e o motivo de tamanha frescura.Seus pais eram nordestinos que fugiram da seca e vieram parar aqui nesta cidade.Eles trabalharam como caseiros,cozinheiros e até como catadores de siris .Vanessa Cristina precisou ralar desde criança e teve uma vida muito dura.

Ajudou naquilo que pôde com suas mãozinhas infantis:

- lavava roupa para fora, fazia faxina e até capinava quintal.

Sua história de vida era muito bonita, mas ela fazia questão em esconder as suas origens debaixo de sete chaves.Então, aquela mulher vitaminada, cheia de brilho no cabelo e laquê, era uma guerreira.Porém para disfarçar, inventava mil proezas a seu respeito.

Dizia que era de uma família rica e que todo o seu dinheiro estava investido no exterior, mas na verdade era a família que estava escondida no interior de Bauru, esquecida pela filha há mais de anos.E para eles Vanessa Cristina nunca existiu, porque quando ela saiu de casa indo direto para a capital, ainda se chamava Maria Querubina, a Bininha do papai.

Deus me livre se alguém descobrisse tal nome assim !

Preferiu esquecer um passado tão sofrido feito o seu, tentando ser uma socialite postiça, vazia e ao mesmo tempo repleta de preconceitos sobre sua própria vida .

A “bombada” não percebia que o seu valor estava dentro dela mesma e vergonha deveria sentir da sua peruca tingida, do seu corpo emborrachado e de suas mentiras que faziam dela uma fingida.Uma produção independente, totalmente de araque.

Até que um dia estava correndo no parque de lá para cá com sua roupa de ginástica, quando seus olhos se encontraram com os outros olhos que não tirava os olhos de um livro.Passou diante dele duzentas vezes, apenas para que reparasse no seu bumbum siliconizado, no panturrilha arredondado e na perna dura feito um bloco de vinte .

Mas para desespero de Vanessa Cristina, aquele homem nem se moveu, lendo suas estórias sentado no banco da praça.

Para ele não existia coisa mais importante na vida do que uma BOA literatura.Era professor de português e o corpinho sarado de Vanessa Cristina não rimava com nenhuma poesia.

Ela não se conformava com tamanho desprezo e foi se apaixonando por seu jeito de homem cultural.E só para lhe chamar a atenção, comprou um livro de poemas.

Sentou-se ao seu lado, na maior concentração.Não demorou muito para que trocassem algumas idéias...

Aliás, não trocaram nada porque ela não abria a boca e a única estória verdadeira que conhecia era a História de sua Vida.E acreditando na sinceridade do professor, com lágrimas nos olhos, lhe falou sobre a luta da pequena Maria Querubina, o seu verdadeiro nome.

Pra quê! Foi uma choradeira só e depois de quatro meses estavam casados.Agora Maria Querubina era uma mulher vitaminada, musculosa e também com a cabecinha cheia de outras histórias que aprendeu a ler com o seu professor particular.A verdadeira beleza se resume de dentro para fora e de cima para baixo, sem precisar de artifícios para chamar a atenção.

Uma mulher culta já fala por si e Maria Querubina reconheceu que não precisava mais fantasiar nada, porque já era uma mulher de valor.E estava aprendendo muito com isto!

Silmara Retti