VOCÊ ME PERDOA?
Desde que Beatriz engravidou aos 16 anos de idade, Seu Walter morreu para o mundo! Armou o maior barraco, acusando a mulher de cúmplice naquela maracutaia toda e aproveitou o ensejo para ter um piripaque fulminante.
Não adiantou dizer que isto acontece com as melhores famílias, porque ele não se conformava que a menininha do papai não brincava mais de boneca.Ela gostava também de um boneco!
Beatriz esperava ansiosamente que o pai saísse de casa para que pudesse fazer a festa pelas costas do infeliz.E foi este detalhe macabro que acabou com a alegria de Seu Walter, fazendo com que deixasse de viver a vida como antes. Trancou-se definitivamente atrás de uma máscara de ferro e não achava mais graça em nada.
O tão famoso almoço de domingo faliu de vez e agora que cada um passasse em sua própria casa.
O que mais lhe incomodava era a traição explícita de Beatriz, por ser uma criança que tinha de tudo e que de repente, cutucou a onça com a vara curta !
Quase matou o “papy”do coração , enganando a todos com aquela carinha de galinha morta.
- Que ódioooooooooo! - rugia.
Mas a vingança de Seu Walter foi cruel demais...Jogou a pobrezinha de mala e cuia no olho da rua sem direito a um pingo de clemência.
O que aconteceu depois com ela, só Deus sabe.
Foi osso duro de roer! Fazia faxina para fora com a barriga enorme varrendo o ladrilho, apenas para conseguir se manter.
Nunca mais se viram.Nunca mais falaram sobre o assunto... Toda aquela mágoa fez um rombo danado no peito de Seu Walter, que passou a ficar muito doente.
Sentia dores ali dentro e recusava fazer uma consulta médica.Pra quê ficar bom, se não tinha mais nenhum motivo para ser feliz?
Os outros filhos tentavam colocar panos quentes na situação, porém não tinha jeito que desse um jeito.
Beatriz estava sozinha e ele nem queria saber notícias de seu paradeiro misterioso.Arrancou todas as fotos da estante e proibiu que tocassem em seu nome, transformando o quarto num depósito de cacarecos.
Foi muito triste para os dois.De um lado estava um pai com o corpo dolorido de tristeza e de outro, uma menina tentando ser mulher às próprias custas.
Era difícil saber quem tinha razão, pois a vida da gente é um tal de acertos e erros que não tem tamanho!
O tempo é curto e não vale a pena ficar amassando barro, no mesmo lugar.O caminho é cheio de surpresas e cair faz parte do dia-a-dia...
Faltava pouco para o nascimento da criança e Beatriz se sentia mais forte do que nunca.
Arrumou algumas coisinhas dentro de uma sacola de plástico e foi para a maternidade.Não tinha ninguém e precisou assumir a sua gravidez com unhas e dentes!
Lembrou-se do pai que havia lhe ensinado desde pequena a ser forte e determinada, enfrentando os problemas com a cara limpa e com muita dignidade.
Assim pensou no seu jeito carinhoso de lhe colocar no colo, na pior das dificuldades e sentiu saudades.
- Ê pai turrão...
Como o velho Walter fazia falta nessas horas!Queria que estivesse ali, com ela.Mesmo que fosse para lhe dar um puxão de orelhas.
Quando o filho de Beatriz chorou para o mundo, ela chorou também.Era uma mistura de emoção, medo, de felicidade...Mas a felicidade maior foi quando aquele homem envergonhado apareceu do nada, trazendo com ele tudo de bom.
Tinha no peito o peso da mágoa, pronta para se desfazer em lágrimas, lavando a alma num sentimento mágico chamado perdão.Eles não conseguiram pronunciar nenhuma palavra, qualquer comentário seria demais naquele momento.
Seu Walter a colocou no colo como se fosse a mesma menininha de sempre.Beatriz ainda tentou lhe explicar aonde tinha errado, mas para quê...Já passou há tanto tempo!
Ele estava se sentindo outro e as dores no peito sumiram, pois eram dores do passado.Tinham muito que conversar, o que se abraçar e o que se tocar.Com certeza domingo teria aquele churrascão na casa do Seu Walter e Beatriz estaria de volta , com um motivo todo especial para ser feliz .
SILMARA RETTI
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