Cremação e cinzas
1. Consta, que os gregos, mil anos antes do Criador já cremavam seus cadáveres. Os romanos faziam o mesmo 750 anos antes de Cristo nascer. A Igreja Católica levou séculos para permitir a cremação de defuntos, dando preferência ao sepultamento no chão cruel dos cemitérios.
2. Foi preciso Karol Wojtyla chegar ao trono petrino para, como João Paulo II, mudar o rumo da história, admitindo, a partir de 1963, o uso das fornalhas crematórios pelos católicos.
3. Aceitando a cremação, o Vaticano cuidou de exigir respeito às cinzas do defunto cremado. E o fez, através de reiterados pronunciamentos das autoridades eclesiásticas, em todos os níveis.
4. Recentemente (outubro de 2016), o Papa Francisco aprovou e divulgou uma "Instrução da Congregação para a Doutrina da Fé" ditando as regras para a cremação e baixando normas a serem adotadas com as cinzas dos defuntos.
5. A Congregação, no citado documento, exige que as cinzas não sejam lançadas no ar, na terra e na água. Determina: "As cinzas do fiel devem ser deixadas para repousar em local sagrado, ou seja, um cemitério ou, em certos casos, em uma igreja ou área separada para este propósito".
6. No que me diz respeito, católico praticante, o que me preocupa não é a cremação. Preocupa-me, sim, o que farão com minhas cinzas.
7. Atento a isso, num daqueles papos em que a idade avançada nos leva a falar sobre o "quando eu morrer", ousei dizer aos meus herdeiros onde as deverão pôr. Se o meu desejo vai ser atendido, aí só Deus sabe.
8. Noite dessas, confidenciando a amigos que me preparava para escrever sobre a cremação do que restará deste mortal que vos fala, após desencarnar, e sobre o destino a ser dado às suas cinzas, fui aconselhado a não fazê-lo.
9. Pediram-me que desistisse da ideia, chamada mórbida ; e que, deixando a morte de lado, continuasse escrevendo sobre os vivos e sobre a vida, inclusive a minha. Disse que ia pensar.
10. O quê? Para minha surpresa, apareceu quem adorasse minha ideia! E até me ofereceu subsídios para dar maior robustez à crônica que ameaçava escrever, determinando o destino a ser dado às minhas preciosas cinzas. Duvidando de sua sinceridade, não aceitei suas sugestões.
11. Tinha em mente que, na cremação, cabe ao dono das cinzas decidir, soberana e livremente, o que devam seus parentes fazer com elas; e mais ninguém.
12. Muitas noites se passaram, desde aquele papo, até que, afinal, decidi dizer, nesta crônica - que peço, seja anexada ao meu processo de inventário -, como gostaria de ver minhas cinzas cuidadas.
13. Atenção: na impossibilidade de fazê-lo nas águas do Jaguaribe, o maior rio do Ceará, minha terra, lance-as nas águas mais profundas do mar de Salvador, onde moro, há mais de meio século...
14. Peço desculpas ao generoso Papa Francisco, por quem nutro filial admiração, por desobedecê-lo. Entendo, Santidade, que Deus não vai perder tempo procurando saber onde puseram meu pó. Deus tem muito o quê fazer!
1. Consta, que os gregos, mil anos antes do Criador já cremavam seus cadáveres. Os romanos faziam o mesmo 750 anos antes de Cristo nascer. A Igreja Católica levou séculos para permitir a cremação de defuntos, dando preferência ao sepultamento no chão cruel dos cemitérios.
2. Foi preciso Karol Wojtyla chegar ao trono petrino para, como João Paulo II, mudar o rumo da história, admitindo, a partir de 1963, o uso das fornalhas crematórios pelos católicos.
3. Aceitando a cremação, o Vaticano cuidou de exigir respeito às cinzas do defunto cremado. E o fez, através de reiterados pronunciamentos das autoridades eclesiásticas, em todos os níveis.
4. Recentemente (outubro de 2016), o Papa Francisco aprovou e divulgou uma "Instrução da Congregação para a Doutrina da Fé" ditando as regras para a cremação e baixando normas a serem adotadas com as cinzas dos defuntos.
5. A Congregação, no citado documento, exige que as cinzas não sejam lançadas no ar, na terra e na água. Determina: "As cinzas do fiel devem ser deixadas para repousar em local sagrado, ou seja, um cemitério ou, em certos casos, em uma igreja ou área separada para este propósito".
6. No que me diz respeito, católico praticante, o que me preocupa não é a cremação. Preocupa-me, sim, o que farão com minhas cinzas.
7. Atento a isso, num daqueles papos em que a idade avançada nos leva a falar sobre o "quando eu morrer", ousei dizer aos meus herdeiros onde as deverão pôr. Se o meu desejo vai ser atendido, aí só Deus sabe.
8. Noite dessas, confidenciando a amigos que me preparava para escrever sobre a cremação do que restará deste mortal que vos fala, após desencarnar, e sobre o destino a ser dado às suas cinzas, fui aconselhado a não fazê-lo.
9. Pediram-me que desistisse da ideia, chamada mórbida ; e que, deixando a morte de lado, continuasse escrevendo sobre os vivos e sobre a vida, inclusive a minha. Disse que ia pensar.
10. O quê? Para minha surpresa, apareceu quem adorasse minha ideia! E até me ofereceu subsídios para dar maior robustez à crônica que ameaçava escrever, determinando o destino a ser dado às minhas preciosas cinzas. Duvidando de sua sinceridade, não aceitei suas sugestões.
11. Tinha em mente que, na cremação, cabe ao dono das cinzas decidir, soberana e livremente, o que devam seus parentes fazer com elas; e mais ninguém.
12. Muitas noites se passaram, desde aquele papo, até que, afinal, decidi dizer, nesta crônica - que peço, seja anexada ao meu processo de inventário -, como gostaria de ver minhas cinzas cuidadas.
13. Atenção: na impossibilidade de fazê-lo nas águas do Jaguaribe, o maior rio do Ceará, minha terra, lance-as nas águas mais profundas do mar de Salvador, onde moro, há mais de meio século...
14. Peço desculpas ao generoso Papa Francisco, por quem nutro filial admiração, por desobedecê-lo. Entendo, Santidade, que Deus não vai perder tempo procurando saber onde puseram meu pó. Deus tem muito o quê fazer!