RIO DOCE - EMBRIONÁRIO SOCIAL
Poucas vezes sabemos quais são as reais intenções de certa parcela da humanidade em prol de um mundo mais sensível, sustentável e consciente, quando se propõe a perpetuação das espécies de vida - florestas, animais e belezas naturais do planeta Terra, por exemplo. Ocorre que já faz mais de um ano do desastre ocorrido no Rio Doce, em Mariana. Do que se constata, foi realizado muito pouco para restaurar a vida naquela localidade, e continuará sendo uma recuperação lenta e gradual que levará bastante tempo para se reerguer novamente. Naquele lugar em que muitos construíram sua história, sua esperança; onde famílias se formaram, cresceram e desfrutaram da vida, da natureza, de maneira em parte, dispersa da visão incessante da benesse lucrativa e desumana.
Na medida em que passou compreender aquele território como seu, o homem perdeu as rédeas e houve o derrame de lama que devastou a riqueza natural, que empregava dezenas de pessoas, pois não soube administrar toda essa força conquistada e a ganância foi tamanha que não foi capaz de prever a catástrofe, que dizimou aqueles povoados. Todos que ali estavam perderam tudo. Somente restaram a lembranças de um tempo de festa, de alegria e de abundância que serviu, outrora, de apoio para a sobrevivência de inúmeras espécies de vida animal e vegetal. No final de 2015 eu escrevera sobre esse acontecimento, como tudo ocorrera. Verifica-se que é possível manter a esperança da reconstrução, mas... “aquele que era a fonte de alimentação, que preenchia os olhos, um lendário patrimônio nacional, se tornou quase um lixo total que tirou a vida de seres humanos, de famílias; que apagou a relembrança de povoados, de vilarejos; que levou a riqueza e à conquista bravos homens e mulheres. O que outrora fora motivo de gargalhadas heroicas se tornou lágrimas de derrota; onde se gritava e se ouvia um fervilhar pulsante de vigor, se tornou um celeiro inerte que levará anos e anos para se resgatar, para trazer um alento e novamente o armistício a muitos (15/11/2015)”.
Voltemos então à atualidade e nos indaguemos sobre o que foi modificado desde aquele cinco de novembro de 2015. Constatamos que as respostas em sua maioria não são tão satisfatórias. Mais uma vez temos muitas promessas, contudo poucas respostas aceitáveis, outras efêmeras que nos parecem que foram articuladas somente no pretérito, no calor dos clamores, no entanto na prática e no refazimento, se fazem vagarosas. Famílias ainda esperam serem contempladas e restituídas de um pouco do que perderam. Muitas acreditaram e ainda aguardam nas palavras que foram proferidas perante o público, em que se afirmava que haverá o novo Rio Doce, de Bento Rodrigues, de Paracatu de Baixo e doutras vilas que foram dizimadas no mar de lama que dissipou a região e mortificou o Rio.
De outro lado existem aqueles que ainda estão tentando justificar o injustificável, que buscam cada vez mais chamar atenção da sociedade, do poder público e de empresários para se eximir. Todavia o tempo se esvai e pouco foi efetivado, pouco foi concretizado! É fundamental que como em outros casos semelhantes, a população organizada se sensibilize e adote providências incisivas para a real execução do que é preciso. Há de se reivindicar com certeza, seriedade e eficiência o que é mandatório para restabelecer a paz, a tranquilidade e trazer de volta a fartura colhida à beira daquele então, caudaloso flume. Não raro, o que há é a discussão sobre as dificuldades existentes, mas as ações parecem ter ficado em terceiro plano. Há um clamor social, uma demonstração midiática a todos, de adoção de providências. Todavia as atitudes ainda não supriram o que se sucedera há um ano. E enquanto isso povos estão na espreita, aguardando, perambulando de um lado a outro, na expectativa de que as coisas advenham. E se não houver a posse do que deve ser feito, irão passar dois, três quatro, dez anos, e ainda teremos resultados precários.
Vamos todos despertar e nos apoiar uns aos outros a uma nova postura para que as ações se sobrevenham no tempo certo, sem mais tardança, sem mais burocracias. Trabalhar e atuar com pensamentos e ações voltadas a resolução do problema e com foco no resultado, se fazem totalmente relevantes neste momento. Acompanhar, interferir e revelar os melhores caminhos, decisões acertadas para que não haja flutuação é indubitavelmente salutar; para que não haja paradas intermináveis; para que trabalhem também todos, com mente e coração voltados àquilo que também é nosso e somos parte. Pois o meio ambiente é abundância de vida, é nossa fonte, nossa perpetuação de espécie. Tudo isso são nossos valores naturais que nos elevam ao patamar de um dos países tropicais com maior variedade e riqueza nativa do mundo! O filósofo francês Albert Camus nos fala: “vou-lhe dizer um grande segredo, meu caro. Não espere o juízo final. Ele realiza-se todos os dias”. Ao se apoderar desse enfoque, poderemos vivenciar ainda mais uma história de vitórias, de boas lembranças, de formação de novas famílias, de uma nova poesia, voltada não para a nostalgia incessante, mas para a alegria duradoura de que tudo que um dia já se foi seja reconstruído e renovado para a nova humanidade que ainda está no embrionário social.