"BRASILEIROS" ENTRE ASPAS

Não recordo quem me ‘apresentou’ a literatura portuguesa, EU muito jovem num passado distante, muita sede de cultura, e emprestou livros antigos. Memorizei: “Vila dos Confins”, autor VIEIRA SIMÕES (edição de 1966 – nasci depois), romance ambientado em Moçambique (ex-colônia portuguesa, liberta em 1975). Referência a dois lusitanos “brasileiros”, ou seja, portugueses com os olhos voltados para o lado oeste do Atlântico (atravessando antes boa parte do continente africano...) – se bem recordo, um enriqueceu e outro interessou-se pelas coisas brasileiras e ao final da estória aparece, iludido por crônica social em linguagem afetada de gírias e expressões pessoais – “champanhota”, “aconteceu beleza” e outras... –, indo ser porteiro de um grande hotel em Copacabana, zona sul e chique, área nobre do Rio de Janeiro, sonhando com a riqueza.........

Aprendi depois. O “brasileiro” era aquele que voltava rico da colônia americana. A princípio, no século XVIII, corrida ao ouro em Minas Gerais. Depois, no século XIX, negociava escravos, porém o tráfico diminuiu, a Inglaterra pressionando desde 1810 para a abolição, arranjou meios comerciais, continuou endinheirado, distribuiu benefícios à população brasileira e colecionou títulos de nobreza. “Abrasileirado” era quem voltava com os mesmos bolsos vazios com que chegara aqui. Fim da entrada de escravos em 1850, início da mão de obra de origem europeia, de um modo geral; portugueses querendo enriquecer... e voltar. Interessante, não? Os retornados davam melhoradas nas aldeias, construíam palacetes, estradas, escolas, igrejas... e, nas cidades grandes, se tornaram sócios de empresas, até mesmo acionistas de bancos. Muito luxo!

Também consta que nos Estados nordestinos, em especial na Bahia, houve cerca de 600 negros fazendeiros e escravocratas, enriquecidos exatamente no comércio de africanos, negociatas efetuadas sob o código “noz de cola”... mulheres compradas para a produção de crias. Relação desigual entre os escravos nascidos “lá” – escravos dos escravos – e os nascidos “aqui”, estes se recusando a certas tarefas. Contudo, não existiu elite negra unida à elite branca, nem foi esse um país de oportunidades financeiras para retorno apoteótico à África.

E aqui estamos, séculos XX-XXI, num Brasil “des-senzalizado, livre e coloridinho”, como diz minha AMIGA carioca Geminiana.

F I M