Transformação
Tania nasceu em berço de ouro, como diria minha avó. Conviví com ela por toda a nossa infância e juventude e nunca a ví querer algo sem possuir.
Vivia numa família estruturada, tinha dois irmãos mais velhos visivelmente obstinados por aventuras e carregava dentro de sí uma segurança que me abismava.
Na verdade, por longos anos eu sonhava em ser um pouquinho do que a Tania era na vida: decidida, cheia de opiniões, inteligente, alegre, divertida e extremamente sutil nas suas colocações.
Não preciso falar que sempre foi alvo de flertes, já que possuía uma beleza um tanto selvagem coberta invariavelmente por roupas caras e de bom gosto.
Eu, de família de classe média, nunca me opus a essa amizade, mesmo tendo consciência da distância que nos separava. Enquanto ela, nas férias, viajava para o exterior com a família por 1 mês, eu tirava 1 semana e buscava pegar um bom sol em Torres, na casa da minha tia preferida.
Estudamos juntas e muito nos ajudamos. Éramos amigas de verdade. Fazíamos planos juntas, dispensávamos qualquer paquera que soubéssemos que uma ou outra estava interessada éramos éticas uma como a outra e isso sempre me agradou.
Chegou a época do vestibular, após termos festejado a saída do Ensino Médio numa festa espetacular preparada pela família da minha amiga.
Busquei a área da medicina veterinária e ela a de medicina clínica.
Decidimos fazer inscrição da Universidade Federal por termos consciência de reunirmos as aptidões necessárias para lograrmos êxito. Mas não foi o que aconteceu com Sandra que, só não passou no vestibular como ficou muito abaixo da média esperada. Um choque!
Como uma menina tão perfeita, com tão boas qualificações poderia não passar no curso que sempre quisera fazer?
Aos poucos comecei a perceber um certo descaso, ligações não atendidas, mudança de hábitos e até mesmo de turma por parte de Sandra.
Já cursando Medicina Veterinária, praticamente sem tempo e resignada com a sua atitude, não mais me envolvia com a sua forma diferenciada de me tratar.
Eis que um dia soube que ela estava viajando para os EUA para cursar Business.
Fiquei feliz por ela e, ao mesmo tempo, triste por não haver despedida.
Passaram-se cinco anos e, numa tarde qualquer já na Clínica onde eu trabalhava, apareceu Sandra. Visivelmente não era a mesma pessoa.
Seu cabelo não estava mais tão sedoso e muito menos sua pele aveludada. Parecia ter envelhecido uns 10 anos.
Nos abraçamos fortemente e decidimos sair dalí e buscar uma cafeteria para colocarmos o papo em dia, já que nesses cinco anos nenhum contato fora feito de ambas as partes.
Foi aí que percebí a diferença. Sandra não se identificou com o Curso de Business e resolveu correr mundo em busca de algo que a completasse. Acabou retornando após um ano e entrando numa Colônia Budista, segundo ela sob desaprovação da família.
A Faculdade de Medicina Clínica foi substituída por horas e horas de contemplação e orações. Suas vestimentas foram trocadas por longos vestidos de cetim com arabescos dourados e os pés nunca mais usaram um sapato de salto.
Contrariando tudo o que se imaginava sobre o seu futuro promissor, hoje Sandra é uma pessoa diferente, mas feliz.
A decepção a fez dar a volta por cima e encontrar novo caminho. Um caminho que, naquele momento, não tinha mais volta.
Out.2016