Assim ou ...nem tanto 69
O quintal.
O quintal começava a seguir ao pátio onde pontificavam a casota do Swing, o poleiro do Simão e um anexo atulhado de inutilidades muito interessantes. Ia-se para o quintal abrindo, cuidadosamente, um portão de madeira que se desfazia a cada movimento mais brusco. Nunca percebi por que o não retiravam de vez mas entendo hoje que há pessoas que preferem saber, preto no branco, onde fica a fronteira, o limite, a linha que, ultrapassada, nos pode levar ao quintal, a outra zona da vida e, até, tornar-nos estrangeiros. O portão que já não dividia, não protegia e só marcava servia para que soubéssemos que começava o quintal. E no quintal havia um capoeiro vedado por uma rede, uma magnífica mangueira que grande parte do ano me dava frutos. Comia-os com prazer sendo maduros ou verdes. Muitas vezes verdíssimos e azedos mas sempre deliciosos! A seguir, uma goiabeira e, depois, um pessegueiro tão caprichoso que só patenteava frutos a alturas verdadeiramente inacessíveis. O restante do espaço era preenchido por capim alto, um abandonado canteiro de jarros e, por fim, o muro que nos separava do Colégio. Do outro lado os alunos jogavam à bola e, muitas vezes, era eu quem a devolvia, encantado por poder seguir o jogo do meu quintal. Quando não havia ninguém no recreio apreciava as lagartixas e os lagartos que apanhavam sol no muro. Conversava, sem distinção, com todos os galos e galinhas, patos, répteis e, sobretudo, comigo mesmo. Fui eu que me disse que um dia, naquele quintal, alguém apareceria com um par de asas que me permitiriam ver a cidade de muito alto. Esperei sempre mas, claro que nunca apareceu ninguém a oferecer asas e que a paisagem lá de cima, com casas mínimas e o campanário irrelevante de tamanho, tive de inventar.