Gabriela
Não a linda morena cravo e canela do Alencar. Eu tô falando do ônibus que ia pra um lugar chamado Gabriela. Lugar esse que eu não sei onde fica, já que eu descia muitos pontos antes do final e ainda assim tinha uma boa caminhada até minha casa. Eu poderia pegar o Zélia e descer, praticamente, no meu portão, mas o Tiago sempre perguntava, naquele tom prepotentemente irônico que só ele tem: "Vai pegar o Gabriela comigo, né?" E eu, que no auge dos meus dezesseis anos me achava muito atarefada, sempre respondia: "Não, preciso chegar cedo em casa". "Pra que, Lucy?" , Ele rebatia. "Pra estudar" , eu devolvia já esboçando um sorriso , pois sabia que ele riria de mim, a "bobona que estuda". Até porque, se nossa vida fosse um besteirol americano, o Tiago seria o capitão do time de basquete que pegava todas e, ao mesmo tempo, o nerd que faz aula de matemática avançada e canta no coral. Nunca entendi isso nele, mas sempre admirei. No fim, eu acabava pegando o Gabriela e me sentia arrependida pelos quinze minutos de estudo que perderia. Mas esse sentimento desaparecia assim que a gente entrava no ônibus, olhava um pra cara do outro e, das duas uma: ou ríamos daquele jeito que os seres humanos riem quando têm dezesseis anos, ou desabafávamos sobre nossos (gravíssimos!) problemas de paixonite. Mas o fato é que, eu não sei quando, como, nem porque, era o melhor amigo que a vida poderia ter me dado. Hoje, não tem mais matemática avançada, nem coral, nem Gabriela. Hoje tem cálculo, trenzão lotado e shows com preços absurdos. Mas, apesar da vida ter nos obrigado a crescer de supetão, sou grata por ainda ter meu melhor amigo pra dividir isso. E por darmos risada igual quando tínhamos dezesseis.