Chão
Minha vó foi quem me deu meu primeiro diário e quem sempre me incentivou a escrever.
Ela costumava escrever diários também, era a única mulher da sua família que havia frequentado uma escola, e escrevia muito bem, “para uma mulher”, na sua época.
Ela costumava chamar o meu avô, o grande amor da vida dela, de Xão.
Eu não entendia muito bem o porquê, até uns 4 anos de idade achava que o nome do meu avô era esse. Mas na verdade era apenas uma forma curta de dizer “Paixão”.
Desde sempre foi Xão pra cá, Xão pra lá. “Xão, vou na feira comprar ovos.”, “Xão, vou fazer um chimas (chimarrão) pra nóis tomar na sacada.”.
Até que meu avô morreu. E minha avó escreveu uma dedicatória para ele no seu diário.
No final, colocou a frase: “Hoje, perdi meu Chão.” Com CH.
Quando ela notou o erro, quase o apagou, mas daí olhou novamente, e de novo. Pensou que assim a frase fazia muito mais sentido.
Porque muito mais do que a paixão da vida dela, meu avô foi, sobretudo, o seu chão, seu alicerce, sua força. E quando estamos apaixonados, frequentemente não “perdemos o chão”?
Pois bem… Foi assim que ela passou o resto de sua vida apaixonada.