O Grande Tolo

O Grande Tolo





Tomei contato com esse termo no fluxo do acaso das coisas que não são acaso. Sei que existe um livro com esse título, não me pergunte de que se trata, o termo me atraiu, apenas isso.

Me pergunto com que freqüência o ser humano se olha no espelho, ao longo de sua vida, e por segundos vê um grande tolo. Qualquer ser humano, desde aquele que opera um Terminal Bloomberg - sistema de 24 mil dólares que fornece acesso instantâneo a todas as informações financeiras do mundo até o varredor de rua. De qualquer forma essa tarja, ou esse rótulo, ou essa definição dá sinais de múltipla serventia. Pelo menos num primeiro instante.

Figuras públicas, digamos Obama, que agora já promete viagens para o planeta Marte em 2030, isso soa como uma tolice vertiginosa, se você pensar que uma empreita de fôlego para a humanidade está, ou deveria estar, mais propensa aos refugiados sírios ou refugiados de toda sorte. Será que é tão mais fácil tentar o destino noutra esfera, ou desviar a atenção para outra esfera, do que tratar um pouco esta que nos serve?

Apesar de não reunir uma opinião formada sobre o citado senhor, sei que iniciou um discurso no célebre Jantar dos Correspondentes na Casa Branca, em 2013, da seguinte forma: eu tenho que admitir que quando me olho no espelho, já não vejo mais aquele jovem muçulmano socialista... (risos fartos da platéia). Eu digo: isso é humor de primeira. No mais, para efeitos de entretenimento, já foi dito que existem dois tipos de políticos: os que tentam dizer sim e os que tentam dizer não.

Nesse cenário em particular, considerando as 25 milhões de abstinências na corrida (do ouro) de outubro 2016, está em curso no Brasil uma faxina (esperamos que se prolongue) digna do que ocorre numa UTI e, em termos médicos, poderia ser descrita como células brancas atacando a infecção, células vermelhas limpando a infecção. Ops, pela madrugada, não há metáfora alguma aí, ok? Pergunte a um médico. Estou no ramo de entretenimento de leitores, apenas isso. Nada de levar ao pé da letra, até porque, por volta de 2012 o dicionário Webster expandiu a definição da palavra “literalmente” no intuito de incluir o modo como é usada erroneamente. Assim, não existe mais uma palavra na língua inglesa que signifique “literalmente”. “Literalmente” não tem sinônimo. Será necessário um vocábulo em latim, quiçá. Ora, fazendo o livre transporte dessa informação para a nossa pátria, quando uma figura pública diz que vai incendiar esse país, como saberemos se está se manifestando no modo figurativo ou literalmente?

A aventura de um viver paulatino, talvez frugal, com certa inclinação a observar distanciado, leva a considerações variadas. Por exemplo, até hoje não entendi se Elizabeth de Windsor é uma boa mãe, quer dizer, será que ela nunca quis ver seu filho se tornar rei? Ou, e esta tem me abocanhado nos últimos tempos, pessoas aplaudem quando alguém cai. O que elas não realizam é que a queda de outrem não as torna mais altas.

Seria o senhor Thaddeus McCotter um grande tolo? Veja a sua declaração de renúncia, em julho de 2012: "a totalidade dos recentes eventos de calúnias, indignidades e enganos pesaram mais fortemente sobre minha família. Assim, consciente de que não se pode reconstruir seu coração, pela saúde de meus entes queridos eu tenho que jogar outro jogo, começar de novo abraçando a promoção de sair do status de funcionário público e voltar a condição de cidadão soberano".

O cara tinha uma cadeira no congresso e se envolveu num escândalo. Ah, sim, concorreu ao posto máximo em 2011 e só. Não reservo interesse por tal figura e sei pouquíssimo a seu respeito. Entretanto, a declaração de renúncia chegou no meu radar. Achei digna de nota.

O grande tolo, de imediato, suscita aquele ou aquela com elevada dose de egolatria dando com os burros n’água no frigir dos ovos. Pode-se dizer isso do dono da padaria ou até mesmo de um artista. Depende da arte. Fazendo um jogo rápido, pegue um ator como Mel Gibson, que estreou em Summer City (1977), durante a trajetória teve uns acertos fenomenais como "Coração Valente” e “A Paixão de Cristo” e de 2003 pra cá, ladeira abaixo. Agora vamos para outra área, música, e o exemplo se chama Heraldo do Monte, pernambucano nascido em 1935, praticamente um assessor da Divindade cá na Terra, tanto e tão bem ele toca aquela guitarra, até hoje, seu trajeto é ladeira acima desde sempre. Gibson, talvez pudesse ser chamado de grande tolo. Heraldo, jamais.

Numa realidade assaz midiática, eletrônica, veloz, corporativa, confusa, dir-se-ia estabanada, sanguinolenta decerto, os tolos de maior ou menor tamanho ou bem se apinham em escassez ou abundância, por uns oramos, de outros nos afastamos.

O Grande Tolo é uma expressão oriunda da área de economia. Algo como um bode expiatório. Para o restante lucrar, é preciso um grande tolo, alguém que comprará a longo prazo e tentará vender a curto. Milhares de pessoas singram suas vidas tentando não ser o grande tolo. É para ele que passamos uma situação embaraçosa. Ocupamos a sua cadeira quando ocorre um descuido de sua parte.

Acontece é que esse termo encontra pouso em todas as áreas da aventura humana. Basta um olhar em perspectiva histórica sobre a ciência, as artes, o empreendedorismo, sem mencionar o imprescindível humanismo. Paira algo paradoxal, senão quixotesco nisso tudo, pois o grande tolo, em suma, supõe que pode obter êxito onde outros falharam.

O melhor do mundo foi feito por grandes tolos.








 
Bernard Gontier
Enviado por Bernard Gontier em 12/10/2016
Reeditado em 15/06/2020
Código do texto: T5789832
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