Um canteiro de plástico

Moro em uma casa que tem toda sua área revestida por piso frio; até as paredes, onde ninguém pisa, são revestidas por cerâmica fria. Um aparte, em filmes japoneses ninjas, durante suas brigas, andam pelas paredes, aí sim as paredes são revestidas por piso frio.

Coloquei na varanda grandes vasos com árvores frutíferas, uma vez colhi limão, e pretendo um dia colher jabuticaba; dizem que quem planta uma jabuticabeira o faz para que seus netos venham a se deliciar com seus frutos. Na espera, decidi aprender a tocar harpa, que tem um curso longo e difícil, mas que não proporciona o mesmo prazer que as jabuticabas, mas, enfim, estarei fazendo algo útil, enquanto espero a colheita.

Todas as vezes em que falo de coisas demoradas me ocorre o noivado do Fantasma, e da srta. Diana Palmer; na selva comenta-se que dura há 400 anos; eu, que não sou dado a exageros, cortaria esse tempo pela metade, mesmo assim 200 anos devem incomodar o pai da noiva, pois ele deve querer ser avô.

Plantei um coqueiro anão, e quero que fique bem claro que a etiqueta lhe deu essa característica, eu nunca faria alusão à sua baixa estatura; enfim, as folhas do não alto coqueiro Invadem minha janela, e ouço o farfalhar que elas produzem, bem ao lado da minha cama.

Para contracenar com o coqueiro anão, pensei em plantar um baobá, que chega a atingir 40 metros de altura. Imaginando o tamanho do vaso, o espaço da minha varanda, e a falsa impressão de que essa árvore está plantada de cabeça para baixo, desisti da ideia, pois os riscos são, literalmente, altos.

Tenho um cajueiro, de cajus vermelhos, informação essa também passada pela etiqueta, e não por ser minha cor preferida; curiosamente, se não aprecio muito o fruto, porém o suco de caju em muito me apraz.

Plantei uma aceroleira, para quem não conhece, é o pé de acerola, mas o texto perderia um pouco da elegância se eu citasse apenas pé de acerola, aceroleira não nos remete a poetas falando de saudades da terra em que viveram sua infância?

Tenho um pequeno pomar em uma casa de cimento, e minhas árvores são visitadas por maritacas; aves que são naturais das zonas rurais, que perderam seu espaço e vieram para as cidades, substituir os pardais, aves cosmopolitas, que quase não os vemos mais.

Minhas árvores são reais, nelas talvez até se desenvolva a fotossíntese, mas falando de pomar em piso frio, de maritacas ocupando árvores na cidade, fico com a terrível melancolia, de que plantei um canteiro de plástico, mentiroso e sintético

Roberto Chaim
Enviado por Roberto Chaim em 07/10/2016
Reeditado em 07/10/2016
Código do texto: T5784695
Classificação de conteúdo: seguro