Pedido de casamento na atualidade: ato de amor, ou encenação social?

É relativamente interessante e preocupante o quanto nos preocupamos com as encenações sociais. Eu havia decidido pedir a minha namorada em casamento. Era, até ali, uma pessoa sem grandes inquietações. A ideia de formar a minha própria família e ter ao meu lado a mulher que amava (e amo) me deixava extasiado. Após um período que eu considerava ser suficiente para nos conhecermos, enfim, decidi. Foi uma decisão complexa, que envolveu todos os poréns possíveis. Mas eu estava seguro. Era a chegada a hora de lhe propor o matrimônio. Feliz e ansioso, eu só precisa ir lá e... E?

O casamento, segundo a história, era na antiguidade uma forma de unir poderes sociais e políticos, como famílias ricas que tinham interesses em comum. A união das pessoas era mera formalidade imposta e fria.

Num segundo momento, o matrimônio passou a ser condicional às regras da Igreja, conforme ditava o Decreto de Graciano, em 1140. O documento citava que o casamento só poderia ser realizado com consentimento, fato que até então não acontecia nas uniões. Ok. Um pouco de história não mata ninguém. Mas voltemos a 2016. Ou melhor, 2015, ano do pedido.

A união que tanto sonhava não seria por interesses financeiros, políticos ou sociais. Afinal, um funcionário público de família simples de Mongaguá nada teria a oferecer à sua noiva, a não ser uma vida simplista. Tampouco aconteceria sem o consentimento de uma das partes. Então, o que seria preciso para que a união acontecesse? Simples. O pedido. De preferência, que fosse aceito e que, em seguida, desse sequência num plano de preparativos matrimoniais que envolvesse festa, roupas, comidas, bebidas, e tudo mais que hoje em dia é tão necessário (é?) e comum nos enlaces. Foi aí que a crise começou.

Historicamente, o pedido de casamento ideal sempre foi composto por um homem, uma mulher e a famosa frase: “Você aceita se casar comigo?”. Hoje, não é preciso nem mesmo ter um homem e uma mulher. O mundo mudou. Na mesma simplicidade de que só é preciso ter duas pessoas para um casamento, independentemente do sexo oposto ou igual delas, a sociedade implicitou a necessidade de que este ato deve ser digno de uma produção hollywoodiana.

Há quem faça flash mob, com encenações perfeitas em locais públicos. Outros preferem eventos familiares, esportivos, sociais. Há quem aproveite festas de aniversários, casamentos de amigos e até baladas. Há pedidos de todas as formas. Tem até assessoria para isso. Se você estiver pensando em fazer o tal pedido, com certeza sabe do que estou falando. Basta acessar o Youtube para comprovar cada pedido incrível e cinematográfico que as pessoas fazem. Eis então a depressão pré-matrimonial que assolou o futuro noivo (no caso, eu).

Nada do que pensava era tão bom quanto o que via por aí. Tudo o que eu rascunhava parecia sem graça. E, por incrível que pareça, o casamento que eu tanto almejava ia perdendo a graça, ficando chato e se tornando um fardo. Mas a culpa não era da minha namorada. Ela nem imaginava o que estava acontecendo. Eu é que me via obrigado a ser fantástico, quando na verdade, só queria a como a minha noiva.

Eu tinha receio de que ela não gostasse, caso fosse simples. Tinha medo de que ela se sentisse menosprezada diante de tantos pedidos extraordinários que constantemente víamos. Ela merecia o melhor, merecia algo especial. Mas eu não era bom para esse tipo de coisa. Uma surpresa ou outra faz parte da relação, mas desenhar o pedido perfeito? Não... Eu estava perdido.

A angústia pelo pedido ideal consumiu horas de sono. Passei muito tempos em frente ao computador, lendo, pesquisando, escrevendo roteiros bizarros, que envolviam amigos, familiares, músicas, locais especiais, vídeos e a porra toda. Mas nada do que eu via conseguia absorver. Naquele momento, eu já não poderia ser a penas o Rafael. Teria que ser um super-Rafael. Não importava se eu era avesso aos pedidos escandalosos ou criativos ao extremo. Eu tinha que ser como tudo o que via: perfeito. Ela merecia!

Mas, será que ela pediu em algum momento por isso? E mais: será que eu seria feliz encenando um Rafael que não era real? Por qual razão eu estava tão chateado e preocupado? O conceito de união a dois não era simplesmente ser feliz um ao lado do outro?

Depois de tanto pensar, pesquisar, pedir auxílio até para as amigas dela, fiz o tão aguardado e desgastante pedido. Como? Me ajoelhei na rua, à noite, quando voltávamos justamente de um casamento de amigos, e pedi. Nada de pessoas por perto, celulares, Youtube, danças, saltos de paraquedas ou qualquer atitude mirabolante. Este foi o meu jeito de iniciar a fase mais importante da minha vida. Deu certo. Enquanto a cena acontecia naturalmente, eu não conseguia me dar conta ao acerto do fardo que estava tirando das minhas costas. No final das contas, o que eu tirei de lição dessa história é que ela estava há tempos apenas esperando pelo pedido mais importante da vida dela, e não por uma encenação midiática.

No fim, foi tão simples, mágico e bom que, no dia seguinte, eu queria pedi-la em casamento novamente.