Diário de Sonhos - #106: Bíblia Satânica
Sonhei que estava com uma antiga amiga minha numa sala escura. Eu estava deitado numa cama. Na verdade, acho que estava amarrado à ela. Não conseguia mexer os braços e as pernas, e também não conseguia virar a cabeça para os lados. Ela tocava no piano, mas não saía nenhum som. Completamente silencioso.
Ela vem até mim e diz pra mim cantar a letra da música. Ela senta no piano ao mesmo tempo que também está de pé ao meu lado segurando uma folha de papel. Começa a tocar. Conheço aquela melodia. É a música "Judas", de Lady Gaga. Vou cantando a letra sem saber o que estou falando. Só lembro sei das partes em que cantos "Judas, Ju-da-as, Judas, Ju-da-as". O resto da letra sai de minha boca sem eu nem saber o que estou dizendo. Tento decifrar o que a letra no papel diz, mas é uma língua que eu não conheço. Letras que eu nunca vi. Chego no refrão. Está em inglês, e agora sei o que estou cantando.
- Oh, oh, oh, I'm in love with Satan, Satan...
Entendi o que significa e paro na mesma hora. A música continua, mas eu não canto. Minha amiga para de tocar o piano e vem a mim. Ela diz que eu tenho que cantar, mas eu digo que não, que tenho medo, que não quero gosto daquela letra. Ela vira o livro (pois o que ela estava segurando não era uma folha de papel, mas percebo que agora é um livro grosso). Na frente se lê Satanic Bible. Ela volta à página do refrão e diz pra mim cantar. Choro. Não quero cantar, não essa letra. Não quero participar disso e você não é mais minha amiga. Apenas me deixe em paz!
E acordei.
Esta semana cheguei a comentar de leve com minha psiquiatra sobre estes sonhos com formas demoníacas. Não entrei em detalhes. É sempre assim. Acordo suando frio com o sonho ainda fresco na mente. Olho em volta, demoro uns cinco minutos pra perceber que estou fora dele. Sinto-me extremamente mal com a lembrança das imagens, sons e palavras. Tenho vontade de contar pra alguém, ali na hora, no calor do desespero. Tenho medo de voltar a dormir. Acabo cochilando novamente. Acordo. Cochilo. Acordo. Cochilo. Repito o ciclo até o despertador me atazanar. As imagens estão distantes, os sons vagos. Sob a luz do sol que entra pela janela já não tenho medo, penso que é besteira e deixo pra lá. Às vezes, durante o dia, minha mente volta a estes pesadelos e fico remoendo, tento aplicar toda minha lógica fria e não religiosa ao que pode estar acontecendo. Que talvez seja algo reprimido em minhas emoções se manifestando através destas imagens. Aí entra em cena meu lado místico (porque apesar de não ter religião isso não significa que seja ateu, mas sim um agnóstico). Peso na balança as incríveis coincidências deste mês, a saber, novamente fraturo o mesmíssimo osso que ano passado deu início ao começo do fim da minha vida. Minha mãe, assim como no ano passado, também se acidenta pouco depois de eu me acidentar (ano passado ela torceu um braço no trabalho e ficou afastada uma semana, este ano ela trincou uma costela e também ficou uma semana afastada). A depressão, o medo. E os sonhos ruins começam sempre acompanhando tudo isso. Queria poder me iludir, fosse através da religião ou do ateísmo, e dizer "é isso e pronto", ou então "é aquilo e fim de conversa". Existe um demônio. Não existe um demônio. É coisa sobrenatural. É só da minha cabeça... seria muito mais fácil. Que triste é o caminho daqueles que escolhem a incerteza, pois o desconhecido ainda é o maior medo de todos.
São Paulo, vinte e nove de setembro de dois mil e dezesseis.