O Vôo da cadeira
Toda vez que o Gus me vê com cara de paisagem ele fica preocupado e resolve arrumar alguma coisa ou programa pra eu fazer. Coisa de amigo irmão atencioso, e nessa ele já me levou para lugares loucos, como uma boate gay, entre outros. Dessa vez, depois de passar algumas semanas esperando uma situação de trabalho se desenrolar, ele resolveu me levar para uma aula de capoeira. Ele já estava fazendo essas aulas a pelo menos uma semana, e achou que seria uma boa se eu fizesse também. Então, fui eu com ele para minha primeira aula.
Chegando lá, fui muito bem recebida pelo instrutor (Contra Mestre) apelidado Coyote, que me apresentou a outros alunos. Me explicou um pouco da ideologia da capoeira e da família da capoeira, que é como todos lá se tratam. Me explicou também que todos são apelidados, de acordo com alguma característica ou ação marcante, como o da Kamikase. A Kamikase é uma menina pequena e magrinha que logo em sua primeira aula se ofereceu para jogar com um mestre, que ao que todos dizem, era enorme. Daí veio o apelido kamikase, ou seja, suicida!
Começamos o treino correndo, e embora eu deteste correr (por causa dos Air Bags) sei que aquecimento aeróbico faz parte, então lá fui eu correndo bonitinho e cheia de pose, preocupada com o meu futuro apelido. Depois veio a parte do treino dos movimentos específicos da capoeira,e embora todos tenham um nome especifico, juro que ainda não gravei nenhum. Era um monte de chutes e rasteiras e viradas para tudo que é lado e que terminava com uma estrela (que lá não se chama estrela). Eu fui tentando acompanhar como podia, preocupada em fazer feio e receber um apelido estranho. Quando a velocidade desses movimentos aumentou, eu definitivamente desisti de tentar acompanhar, afinal era só a minha primeira aula, e preferi ficar parada e não fazer nada errado. Nessa hora, O Coyote resolveu me dar outro exercício e me pôs de frente para uma cadeira me pedindo uma seqüência de 20 chutes com cada perna, 5 vezes. Beleza, pensei! Sempre dava vários chutes no Kung Fu, então ali seria mole. 5 vezes 20 era tranqüilo! Só que.... já faziam semanas que eu não fazia nenhum tipo de exercício, e quando cheguei na quarta serie de 20, já não estava quase sentindo as pernas. Alem do mais, ainda estava pensando naquela coisa de apelido,e me esforçava para dar chutes altos e fortes, para ficar bem na fita e ganhar um apelido bonitinho. Estava pensando em algo tipo “Chute do Dragão!” Ou “Garota Kung Fu”, ou “Alma Shaolin”, quando sem perceber, comecei um chute muito mais baixo do que devia e que na subida pegou em uma lateral da cadeira. Parece que vi tudo em câmera lenta. A cadeira subindo, dando quase dois giros no alto, atravessando uma parte da quadra e indo cair no chão com todo o barulho que vocês puderem imaginar! Todos pararam o que estavam fazendo para ver de onde tinha vindo aquele barulho, e viram a cadeira caída, absurdamente longe de mim e minha cara de chocada. É lógico que todos começaram a rir, e é lógico que eu não sabia onde enfiar a minha cara. O Coyote dizia coisas como “isso acontece” e “é normal, todos já acertaram a cadeira”, mas eu só pensava que esse tipo de erro não podia acontecer durante um jogo. Que esse tipo de erro não podia acontecer nunca, porque podia ser o rosto de alguém, embora fosse apenas uma cadeira. E o pior... que depois disso, meu apelido seria algo como... “coice de mula” ou “pernas desengonçadas” ou ainda “menina cadeira”. Já imaginou? “O da cadeira, corre pra lá!” ou “Coice, faz assim!” Péssimoooo!
O final da aula foi com o jogo. Lindo, excitante, empolgante! Não tenho formas melhores de descrever o jogo da capoeira. As músicas, as palmas... enfim! Tudo é muito legal!
É claro que ainda não tive coragem de voltar pra segunda aula e descobrir afinal qual será o meu apelido. Mas sei que vou voltar pra ver no que esse vôo da cadeira deu. Um dia minha curiosidade me vence e eu volto!