A tecnologia e a permissão
Sensação estranha essa de ter menos tempo atualmente do que eu tinha nos áureos tempos de trabalho, estudos, vida social e família.
Como assim, se a tecnologia entrou na minha vida sem pedir licença e veio para facilitar e agilizar os processos que me permeiam?
Não, não sou analógica. Sou da geração dos “convertidos” que, estando no mercado de trabalho, não ousou sequer dizer: “não quero, não gosto”. Permití a sua entrada sem qualquer argumento contrário e, a partir da década de 80, a transformação foi sendo operada de tal forma que, quando eu ví, na minha mesa não mais estava uma IBM 8000; e sim um microcomputador cinza, com tela de fundo escura, enquanto via ao meu redor enormes fitas que armazenavam programas operacionais e cartões perfurados sendo conferidos por diversos funcionários em áreas enormes dentro da empresa na qual eu trabalhava.
Subitamente surgiram os data-centers, a internet discada, as redes sociais. Tudo à minha volta, sem qualquer resistência. Não podia resistir! Por não ter volta, aprendí a gostar e admirar quem conhecia profundamente o assunto. E também passei a acreditar no que ouvia na virada do século: de um celular eu poderia fazer quase tudo, acessar o mundo, conversar com as pessoas como se estivessem ao meu lado, interagir no tempo e hora que quisesse. Sorte minha ter dado crédito à tamanha “piração” na época.
Apesar de tudo, nestes tempos eu me permito resistir à falta das palavras, de abraços, de beijos, de trocas olho no olho. Estou quase abortando os infindáveis emotions, visivelmente mecânicos, e sonhando com um bate papo com afetos regado à chimarrão nos finais de tarde, com o celular desligado.
(Publicada na coluna do Grêmio Literário Patrulhense, na FOLHA PATRULHENSE, em 22/09/2016)