EMPODERAMENTO?
EMPODERAMENTO?
Miguel Carqueija
De vez em quando uma palavra ou expressão sai do nada e de repente está sendo usada em toda parte, como se fosse obrigatório, e ninguém se lembra de contestar, é carneiramente que a sociedade aceita o novo costume, sem questionar. Principalmente a grande mídia quase não é mais questionadora. É bem um sinal da Idade das Trevas.
Poucas décadas atrás surgiu o tal do “politicamente correto”, patrulhamento de consciência vindo lá dos USA, e aceito tranquilamente por muitos jornalistas, e assim impingiu-se à opinião pública que coisas erradas eram certas e vice-versa, só por serem ou não, consideradas “politicamente corretas”; e ninguém jamais explicou com que autoridade haviam sido feitas as definições.
Vivi num tempo em que entregava ou se atendia “a domicílio”. De repente e por toda a parte, sem explicação nenhuma, virou “em domicílio”. Se é por causa da gramática então o certo seria entregar ou atender “no domicílio”. Mas ninguém lembra disso...
Da mesma forma, parece que na mídia existe ordem interna para falar “mulher” (querendo dizer mulher casada) em vez de “esposa”, e “dele” ou “dela” em vez de “seu” e “sua”. É horripilante a maneira de falar dos repórteres de tv, faltando-lhes até a educação.
Vejamos agora essa história de “empoderamento”, neologismo tão feio que parece até um palavrão. Refere-se a grupos heterogêneos que sofram algum tipo de opressão ou discriminação, minorias ou mesmo maiorias. Fala-se de fato no “empoderamento” de mulheres e de negros. As mulheres são uma maioria mas que de fato sofrem opressão por parte dos homens — fato real, embora revoltante.
Mas, o que quer dizer “empoderamento”? Pelo que o nome diz, a chegada ao poder, de algum modo. Note-se que o termo é extremamente feio, e facilmente pode ser confundido com “emparedamento”. Não duvido que já repórteres apressados ou pessoas mais limitadas tenham feito essa confusão que aliás pode resultar em encrenca. Já pensaram se algum político resolve defender o “emparedamento” das mulheres? Conta-se que certo político famoso de Minas, há muitos anos atrás, foi ler um discurso em homenagem a algum cidadão ilustre de sua terra. O discurso havia sido escrito por outra pessoa, como acontece muito. A certa altura o texto dizia que o homenageado era qualquer coisa assim como um dos cidadãos (ou literatos, não sei) mais importante, “quiçá de Minas Gerais”. Ora bem, nosso bom político não conhecia a palavra “quiçá” e leu o que julgou entender: “cuíca de Minas Gerais”.
E não esqueçamos aqueles roceiros que se dirigem ao juiz chamando-o de “Meretríssimo” e aos deputados como “Vossas Insolências” (alguns até merecem...).
Mas estimular o tal do “empoderamento” não significa simplesmente açodar uma luta pelo poder, jogar uns contra os outros, promover guerra de classes, de sexos, de raças (sem esquecer que há uma só raça humana, “homo sapiens”), estimular o ódio e a intolerância? Não é preferível defender o amor, a concórdia, a compaixão e o Direito?
Tudo isso me fez lembrar uma passagem antológica do mangá “Sailor Moon”, de Naoko Takeushi. Peço licença para citar este exemplo tirado da ficção, de tão significativo. É quando a Rainha das Trevas, Neherenia, confronta a heroína e lhe diz:
“Chegou a hora de medirmos os nossos poderes para decidir qual de nós duas será a dominadora deste planeta.”
A resposta de Sailor Moon é lapidar:
“Este planeta pertence àqueles que nele habitam!”
Analisando este diálogo vemos que, na curta e tão simples resposta da Princesa da Lua, está toda uma carta de cidadania, de direitos. Sailor Moon não aceita a premissa da outra: a ela não interessa a disputa pelo poder: não quer ser a dominadora do planeta, mas tão só a sua protetora. E outorga a todos nós direito de propriedade. Por aí se conclui, por exemplo, que os índios têm de ser respeitados, pois são os donos da Terra. E todos nós, mesmo os animais visto que, pelo simples fato de habitarem na Terra, tornam-se co-proprietários da mesma. Então concluimos que não se trata de disputar o poder sobre a Terra, mas de partilhá-la. É fato que alguém tem de exercer o poder em suas várias escalas e setores: mas que o faça como uma missão, até mesmo como uma cruz: para servir.
E é por isso que, em vez de lutar por “empoderamentos” e “emparedamentos” é preferível seguir o lema da própria Sailor Moon: lutar pelo Amor e pela Justiça. Que já é, diga-se de passagem, um lema completo e abrangente.
Rio de Janeiro, 13 de setembro de 2016.
imagem da série Sailor Moon
EMPODERAMENTO?
Miguel Carqueija
De vez em quando uma palavra ou expressão sai do nada e de repente está sendo usada em toda parte, como se fosse obrigatório, e ninguém se lembra de contestar, é carneiramente que a sociedade aceita o novo costume, sem questionar. Principalmente a grande mídia quase não é mais questionadora. É bem um sinal da Idade das Trevas.
Poucas décadas atrás surgiu o tal do “politicamente correto”, patrulhamento de consciência vindo lá dos USA, e aceito tranquilamente por muitos jornalistas, e assim impingiu-se à opinião pública que coisas erradas eram certas e vice-versa, só por serem ou não, consideradas “politicamente corretas”; e ninguém jamais explicou com que autoridade haviam sido feitas as definições.
Vivi num tempo em que entregava ou se atendia “a domicílio”. De repente e por toda a parte, sem explicação nenhuma, virou “em domicílio”. Se é por causa da gramática então o certo seria entregar ou atender “no domicílio”. Mas ninguém lembra disso...
Da mesma forma, parece que na mídia existe ordem interna para falar “mulher” (querendo dizer mulher casada) em vez de “esposa”, e “dele” ou “dela” em vez de “seu” e “sua”. É horripilante a maneira de falar dos repórteres de tv, faltando-lhes até a educação.
Vejamos agora essa história de “empoderamento”, neologismo tão feio que parece até um palavrão. Refere-se a grupos heterogêneos que sofram algum tipo de opressão ou discriminação, minorias ou mesmo maiorias. Fala-se de fato no “empoderamento” de mulheres e de negros. As mulheres são uma maioria mas que de fato sofrem opressão por parte dos homens — fato real, embora revoltante.
Mas, o que quer dizer “empoderamento”? Pelo que o nome diz, a chegada ao poder, de algum modo. Note-se que o termo é extremamente feio, e facilmente pode ser confundido com “emparedamento”. Não duvido que já repórteres apressados ou pessoas mais limitadas tenham feito essa confusão que aliás pode resultar em encrenca. Já pensaram se algum político resolve defender o “emparedamento” das mulheres? Conta-se que certo político famoso de Minas, há muitos anos atrás, foi ler um discurso em homenagem a algum cidadão ilustre de sua terra. O discurso havia sido escrito por outra pessoa, como acontece muito. A certa altura o texto dizia que o homenageado era qualquer coisa assim como um dos cidadãos (ou literatos, não sei) mais importante, “quiçá de Minas Gerais”. Ora bem, nosso bom político não conhecia a palavra “quiçá” e leu o que julgou entender: “cuíca de Minas Gerais”.
E não esqueçamos aqueles roceiros que se dirigem ao juiz chamando-o de “Meretríssimo” e aos deputados como “Vossas Insolências” (alguns até merecem...).
Mas estimular o tal do “empoderamento” não significa simplesmente açodar uma luta pelo poder, jogar uns contra os outros, promover guerra de classes, de sexos, de raças (sem esquecer que há uma só raça humana, “homo sapiens”), estimular o ódio e a intolerância? Não é preferível defender o amor, a concórdia, a compaixão e o Direito?
Tudo isso me fez lembrar uma passagem antológica do mangá “Sailor Moon”, de Naoko Takeushi. Peço licença para citar este exemplo tirado da ficção, de tão significativo. É quando a Rainha das Trevas, Neherenia, confronta a heroína e lhe diz:
“Chegou a hora de medirmos os nossos poderes para decidir qual de nós duas será a dominadora deste planeta.”
A resposta de Sailor Moon é lapidar:
“Este planeta pertence àqueles que nele habitam!”
Analisando este diálogo vemos que, na curta e tão simples resposta da Princesa da Lua, está toda uma carta de cidadania, de direitos. Sailor Moon não aceita a premissa da outra: a ela não interessa a disputa pelo poder: não quer ser a dominadora do planeta, mas tão só a sua protetora. E outorga a todos nós direito de propriedade. Por aí se conclui, por exemplo, que os índios têm de ser respeitados, pois são os donos da Terra. E todos nós, mesmo os animais visto que, pelo simples fato de habitarem na Terra, tornam-se co-proprietários da mesma. Então concluimos que não se trata de disputar o poder sobre a Terra, mas de partilhá-la. É fato que alguém tem de exercer o poder em suas várias escalas e setores: mas que o faça como uma missão, até mesmo como uma cruz: para servir.
E é por isso que, em vez de lutar por “empoderamentos” e “emparedamentos” é preferível seguir o lema da própria Sailor Moon: lutar pelo Amor e pela Justiça. Que já é, diga-se de passagem, um lema completo e abrangente.
Rio de Janeiro, 13 de setembro de 2016.
imagem da série Sailor Moon