Nossa própria mortalidade
Raramente nos lembramos de nossa própria mortalidade, mas eu tenho pensado muito na minha devido ao câncer da minha mãe, cujo dia de fazer a cirurgia se aproxima. E tudo indica que ela terá mesmo que fazer uma mastectomia, ou seja, retirar totalmente o seio. Por enquanto, mãe tem falado no assunto com naturalidade, dizendo que não liga para vaidades e que não está pensando em fazer logo a reconstrução mamária , já que, como terá que fazer a radioterapia, prefere esperar para não atrapalhar o tratamento.
Porém, eu sei que este tipo de procedimento é traumático, pois uma mastectomia é uma mutilação, a pessoa ficará com os movimentos limitados por um bom tempo e, ainda que faça posteriormente a reconstrução mamária, a perda do seio mexe com a autoimagem e a feminilidade. Eu não sei o que dizer. Farei o que for possível. Na verdade, já estou fazendo, assumindo grande parte do trabalho doméstico, cozinhando. Mas tudo isto é sempre difícil, traumático mesmo. O câncer e o fato de alguém tão próximo a nós poder morrer só me revelaram várias verdades: que nunca sabemos o quanto os golpes da vida podem ser cruéis, que jamais estamos prontos para nada e sempre podemos ser pegos de surpresa.
E eu também aprendi que tudo, tudo mesmo pode nos acontecer. O que está acontecendo com mãe pode acontecer comigo, com qualquer pessoa. A vida pode parecer muito injusta, mas não sabemos seus mistérios.