Os miseráveis, de Victor Chaim
Todos já assistiram a filmes policiais, com fantásticas perseguições pelas ruas, quando os carros se cruzam, pelas esquinas, quase se chocando, e não se chocam; na vida real, num choque de roteiros, os carros também se chocam.
Eu não acredito que havia necessidade de comprovar isso na prática, poderia apenas me apoiar na lógica, mas não,atravessei uma preferencial, não minha é claro, e fui surpreendido por um ônibus; curioso que a expressão – Eu não vi nada – se manifestou, naquele instante, de forma tão literal, meus óculos voaram longe... e eu não vi nada.
Tateando pelo interior do veículo, localizei os óculos e saí para a rua, quando o motorista do ônibus perguntou:
-O senhor não viu a placa de cruzamento com preferencial, o que significa que o Sr deveria parar? E eu respondi prontamente:
-Vi sim, e o que o senhor deseja, que eu me suicide agora?
Hienas, abutres, além de todos os animais de rapinas, montaram a plateia; tenho certeza de que, se eu cobrasse bilheteria, ficaria rico naquele momento, e concluí que a peça ficaria em cartaz por muito tempo.
Se ninguém me perguntou se eu havia me machucado, ou se precisava de algum socorro, logo começaram as acusações:
-Nem sei para que esta placa de PARE serve, ninguém obedece.
-Todos os dias os acidentes se repetem, quantos irresponsáveis dirigindo.
Um se aproximou, para ver os estragos de perto, e eu tive a nítida sensação de que tinha algemas na cintura, pronto para usá-las, preferi imaginar que ele tinha saído de um motel, e teria usado aquelas algemas para atender velhas taras, e não para prender um velho motorista irresponsável... no caso eu. Isso seria sensação de culpa?
Então gritei:
-Pronto, a comédia terminou, paguem a pipoca na saída, e esperem pelo próximo acidente ... amanhã.
O policial, no posto militar, me chamou de irresponsável; a companhia seguradora me disse que a franquia é de dois mil reais; a concessionária me disse que os reparos demorariam 45 dias, e meus filhos disseram:
-Graças a Deus o Senhor não se machucou... e eu disse
-Juro, nunca mais vou dirigir, nem assistir a filmes em que acontecem perseguições fantásticas, isso induz a falso convencimento.