VIOLETA
 
     A vida para mim sempre é bela. Não que eu a veja como algo perfeito. Inclusive, penso que as suas incertezas e durezas a torne ainda mais encantadora e única. Somente o fato da nossa presença e consciência no mundo já seria o suficiente para todo o deleite. Como é bom acordar e sentir a beleza do dia. Pode ser uma manhã ensolarada do verão ou um dia frio e chuvoso do inverno. Cada situação nos oferece algumas possibilidades de vivê-la e de nos alegramos. A vida pela vida, do jeitinho que ela pode ser, é o grande motivo para o nosso prazer em viver. Claro, deveremos buscar sempre o de que melhor possamos conseguir, pois, a possibilidade de mudança é o melhor que temos em nós.

     Agora, vamos refletir sobre a morte. Na verdade o binômio vida-morte faz parte desse sistema. A vida traz em si essa outra metade, a morte. A vida é a condição sine qua non para a morte. Desde a fecundação trilhamos por esse dois caminhos: a degenerescência ou a sobrevivência. Mesmo ainda quando não tínhamos consciência jogamos com essas duas possibilidades: existir ou não existir, ser ou não ser. Acordamos para a vida com essa dualidade ou talvez não. Também, não vejo a morte como uma oposição à vida. Entendo que esses fenômenos fazem parte de um fluir continuo, sem início ou fim. Nascemos, dormimos, acordamos, amamos, sofremos, trabalhamos e vivemos com a indissociável possibilidade da morte. Por que então o espanto, a angústia e surpresa da sua realidade? Vejo a morte, assim como o nascimento, como um instante. A vida se processa na complexidade da existência. É na prática diária que construímos seus significados ou somente a sua praxis. Apesar de entrarmos no processo de decadência desde a primeira mitose do zigoto, em algum momento essa realidade acontece em sua plenitude: morremos em nossa totalidade existencial.

     O processo de morte é um fenômeno continuo e pari passu com a vida. O adoecimento pode alterar o processo em si e às vezes acontece em forma de um longo romance, talvez um drama reflexivo como os Machadianos e os de Dostoiévski. Às vezes vem em forma de crônica leve, como as de Rubem Alves ou dilacerante como as de Nelson Rodrigues. Também, pode vir em forma de poesia Drummondiana ou como no primitivismo de Manoel de Barros. A morte, inclusive, pode ter cores. Escolha a sua. Eu prefiro o alaranjado, meio dourado da cor do alvorecer ou pode ser azul. Pode ser anunciada em carta, com direito às lembranças e beijos para os filhos e amigos. Às vezes como num alô, seguido de um suspiro. Como a minha morte virá? Não sei. Pode vir tão breve como uma gíria ou uma escrita de telegrama: já fui. Que esse processo tão dentro de mim, tão necessário, tão vital e tão próximo não me assuste mais.