DETALHE DE NÓS DOIS: AUTOR & ESCRITOR
Aprendi a montar uma aula e valorizar ainda mais o papel do professor na valorização do escritor, do incentivo ao alunado e na formação de um país.
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Conto “A TERCEIRA MARGEM DO RIO”, de JOÃO GUIMARÃES ROSA
1---Presença da água (repetição significativa em outros contos) - elemento ambíguo, símbolo de vida ou de morte e confirma personagem duplo, fundido nas duas significações: morte e vida, luz e escuridão, paz e perigo, prisão e liberdade. // Água corrente e também charco - luz presente é o sol e o fogo feito pelo homem, se fizer... Noite, ausência de luz e do fogo, presença do frio.
2---Clima de mistério de dúvida - rio, duas margens geográficas semelhantes, lado de “cá”, lado de ”lá”, terceira margem metafórica, o desconhecido, estranho e inusitado (como os três mistérios da Santíssima Trindade: três pessoas em uma, Pai, Filho e Espírito Santo).
3---Aspecto mítico - mitologia mundial rica nas imagens do rio, do barco e do barqueiro, simbolismo inesgotável. // Neste conto, o rio é o não-lugar; é a instância paradoxal entre o ser e o não-ser. O homem-rio, que se integra a este e desempenha sua função: “Nosso pai é aquele que não tinha ido a nenhuma parte.” // Arca de Noé - episódio bíblico, referência direta no texto - pai saberia de um novo dilúvio? Canoa especial, de pau vinhático, porém pequena para caber somente o remador. Barca ao contrário - nem salvação de outros nem aliança com Deus: exclusão voluntária, afastamento do convencionalismo, separação da família, transição entre o senso comum e o não-senso.
4---“Nosso pai” é o próprio morto-vivo que supera todos os perigos - enchente, frio, fome; tem pacto com Deus, pode ser um enviado, mas tem a figura de Caronte (mitologia grega) - também como este, imortal, ‘viveria’ na pessoa do filho. // Personagem ambivalente, “nosso pai” transita entre as margens e não pertence a nenhuma - todas as características de um Janus (mitologia grega novamente) e habita um barco.
5---Aspecto psicológico - exclusão voluntária, o rio o seduz, caos movente com que se identifica. O narrador é seduzido pela figura do pai, mas não o assume, o que não o impede de ocupar o seu lugar, o lugar da loucura. O saber da loucura é difícil, fechado, esotérico, no espaço de um grande segredo, a curiosidade do saber, a busca do equilíbrio que não está em nenhuma parte da água que não pára.
6---A análise psicanalítica, em teoria, leva o indivíduo a conviver com o ser e o não-ser, o lado louco e o lado normal, o convencional e o não-convencional, a vida e a morte, a realidade e a magia, a razão e o desrazão, buscando sua integração que, na realidade, nunca é atingida.
7---Aspecto ideológico - a família é a dona da linguagem da ordem, o símbolo do convencional - o pai a abandona, mas não se afasta dela e continua exercendo força e domínio sobre todos. Ignora o casamento da filha, o neto, não ouve a mulher, ignora a presença do padre, dos soldados e dos repórteres, fugindo assim das pressões sociais, religiosas e políticas, numa atitude inexplicável. O sentimento de culpa do filho é não assumir o lugar do pai.
8---A travessia do rio, o barco e o barqueiro representam o próprio texto literário e circula entre as duas margens - o ser e o não-ser etc. etc. etc.
FONTE:
“O estudo da ambigüidade em quatro contos de Guimarães Rosa - A terceira margem do rio, Ripuária, Ato de almirante e Barca da vaca”, artigo de Ivete Lara Camargos Walty - BH, SLMG, n.671, 11/8/79.
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