O FÃ NÚMERO UM!

Quando Joelma encarava aquele palhaço de pijama, se despreguiçando no sofá, tinha vontade de lhe dar uma vassourada no cangote e depois sumir do mapa para sempre.Onde tava com a cabeça em se casar com um thothoba do tipo de Candinho, que só servia para lhe servir? E para fazer uma graça, ele ainda areava uma panela daqui, encerava um assoalho dali e só não fazia a faxina geral porque andava de braço dado com a preguiça.

Na verdade Joelma reclamava de barriga cheia, e bem cheia, pelos quitutes de Candinho, porque a casa tava um brinco e cheirava à limpeza.Ele não curtia ser a Escrava Isaura da casa, porém estava desempregado há dois anos e alguém tinha que sacudir a poeira e dar a volta por cima do tapete.Mesmo assim Joelma não dava um pingo de valor, achando que o rapaz não passava de um prego enferrujado.

Namorar, nem em sonho.Joelma trabalhava fora, vivia cansada e com dor de cabeça.Todos os dias ela fiscalizava o ambiente da porta da sala, reclamando que o seu sofá preferido estava totalmente ocupado por aquele vulgo “desocupado”.Não percebia que o jantar estava quentinho na mesa, o chão brilhava e tudo estava perfeitamente bem.

Após servir aquela comidinha gostosa, Candinho ficava na sua cola, matraqueando o tempo todo:

- A máquina de lavar pifou de novo!A panela de pressão tava queimada e o preço da laranja subiu pela segunda vez no ano.

Santa chatice! Joelma queria mesmo tomar um banho bem quente e bum, ir direto pra cama.Não suportava mais o papo furado daquele homem cafona, que insistia em usar um avental todo sujo de ovo e molho de tomate.E que culpa tinha Candinho se não arrumava um emprego fora de casa, hein? Se já havia passado dos quarenta e na banca da feira o verdureiro lhe chamava de titio...

Desde que foi mandado embora da firma, morreu para o mundo e se sentia um farelo humano.Guardou seu terno de tergal no baú e fez de seu pijama velho um uniforme diário.

Ela fazia um sucesso danado com o seu programa no rádio e não tinha tempo para as lamúrias de Candinho, que não passava de um tonto.E logo ele percebeu que precisava reconquistar urgentemente o coração endurecido de Joelma, antes que levasse um toco daqueles!

Então resolveu colocar para fora todo o seu sentimento, numa carta anônima, dizendo que era um homem apaixonado que fazia tudo pela mulher ingrata. Ela lia cada palavra com lágrima nos olhos, nem desconfiando que a pobre vítima daquela megera só tinha um nome: Candinho! Um marido assim tão devoto e competente era um achado.- pensava –Ele passou a lhe escrever todos os dias e Joelma defendia a honra do pobre donzelo desamparado com unhas e dentes. Suspirava com seus botões, louquinha da silva para conhecer aquele príncipe encantado que dava o maior ibope ao programa.

Até que ela conseguiu marcar um encontro às escondidas com o ouvinte secreto e chegou em casa mais cedo, se embonecando toda para a famosa “reunião de negócios”.

Um negócio que o marido já não conhecia mais porque tinha falido!

Candinho se fingia de morto, esparramado no sofá como uma sopa de minhoca.Disse que estava cansado e dormiria cedo, só pra variar.

- Sinto muito, não posso lhe acompanhar, querida.

Ela adorou, despedindo-se com um beijo na testa. Estava em cima da hora e após estacionar o carro numa quebrada desconhecida, aquele vulto se aproximou em câmera lenta.Olho no olho, com o peito quase explodindo de emoção.E que surpresa! Diante dela estava Candinho, com o mesmo jeito apaixonado de sempre, lhe estendendo os braços num abraço, se apresentando como se fosse a primeira vez.

- Muito prazer, Candinho.- sorriu, lhe estendendo a mão.

Joelma ao ver o marido quase morreu de vergonha; pelo descaso, pelo deslize e pela traição.

Era o mesmo homem que lhe preparava uma comidinha gostosa todos os dias, arrumava suas roupas no armário e que não se importava em viver atrás das cortinas para que pudesse brilhar. Ela lhe abraçou muito mais forte, enxugando as lágrimas para enxergar melhor a sua alma iluminada e lhe pediu perdão.

- Você é um homem de muito valor! – murmurou.

Candinho valia ouro.Era só conferir a quantidade, o conteúdo e principalmente a qualidade daquele homem, que mesmo no anonimato abria as cortinas do seu coração para que a sua musa pudesse brilhar cada vez mais, como uma estrela cintilante.

Silmara Retti