Você é muito fechada

Tenho o defeito de ser transparente. Meu humor pode ser facilmente detectado pelas músicas que ouço. Tento ser durona, esconder os meus sentimentos, pois sei como é difícil ser sincera consigo mesmo e com os outros. Mas tudo em vão. Eu sinto tudo e tudo fica escrito em minha testa. Apesar disso, certa vez me disseram que sou muito fechada. Mas para aí... eu não sou esse tipo de gente que fica se expondo para chamar a atenção. Prefiro ser aqueles que nunca são notados.

Só que esse alguém era muito importante para mim e que me conhecia bastante, como pouquíssimas pessoas no mundo, eu diria. Porém, esse alguém parecia sempre ter a necessidade de escavar o mais íntimo do meu ser. Queixava-se que eu não permitia que fosse atravessado o limite estabelecido por mim. Por isso considerei comentário e coloquei na cabeça que eu precisava dar mais espaço para as pessoas na minha vida.

Esse espaço leva em conta confiar. Contar os meus medos e segredos, planos e expectativas. Ser um pouco menos durona, misteriosa, enigmática. Baixar a guarda. Sair da defensiva. Me desvencilhar da ironia habitual. Nem que fosse apenas nos dias de sol, fins de semana, conversas cara a cara. Me tornar assim, um pouquinho mais vulnerável. Correr o risco de quebrar a cara, pois nem sempre as pessoas vão te compreender e te magoaram com a mesma facilidade que te fazem rir.

Oh, céus! O que sairá dessa experiências? Melhor, quem me fez usar esse escudo?

A busca da independência, talvez.

Eu sempre quis me sentir livre. Nem que fosse um pouquinho. Sentir sem sentir culpa de nada. Mas eu não sou independente completamente ainda. Eu ainda estou buscando-a. E minha armadura me ajudou nisso.

Confesso que demorei até enxergar e admitir para mim que eu era uma dessas pessoas que vivem dentro de uma bolha (mas atirei a primeira pedra quem não é assim em alguma fase de sua vida). Todos nós temos medo de sentir ao extremo, de viver intensamente cada momento, de ser feliz sem sentir culpa por isso.

Eu sou assim a maior parte do tempo. Porque dedico muito tempo ao meu trabalho e faculdade. Se não estou com um pensamento em um, estou no outro. Graças a Deus, pois sempre procuro fazer bem o meu trabalho apesar das dificuldades que enfrento e tento levar a sério o meu estudo (meu outro emprego – estou igual ao pai do Chris. Rs). Só que essa rotina muito doida acaba que inconscientemente me afastando das pessoas. Não sem razão as pessoas me acusam de sumir (mas, gente, às vezes eu sinto que sumo até de mim mesmo, que dirá do mundo).

Por ironia do destino, justamente a pessoa que me cobrou mais humanidade, digamos assim, usou a brecha que eu abri contra mim. Quando achei que estava me curado, me peguei trancando todas as portas mais uma vez e colocando o fone de ouvido no último volume só para fugir da realidade, das mentiras e incompreensões desse mundo que definitivamente não é meu. Pensei em não me misturar mais. Ora bolas, meu coração não é de plástico. Caramba, eu não posso esticá-lo e fazê-lo voltar ao normal. Ele não desmonta como me convém.

Em silêncio segui meu caminho. Não foi tão difícil assim. Fiz como das últimas vezes. Escrevi durante madrugadas inteiras e canalizei o que me afligia para o papel. Ocupei ainda mais minha cabeça e logo o meu coração deixou de bobeira e também entrou no ritmo. Segui em frente. Decepções em geral nos fazem refletir sobre a maneira que levamos a vida. Principalmente quando estamos sozinhos. As músicas ganham outro significado. O pôr-do-sol e uma tarde de chuva também. Só nos resta agradar a nós quando tudo parece perdido. Um das tarefas mais complicadas, ao meu ver.

Como eu poderia saber quem eu sou sem vivenciar um pouquinho esse mundo? Sou uma ótima observadora. Consigo ler nas entrelinhas, capto o subtendido. Mas nessa parte da história, precisei sair dos meus muros, vestir o meu melhor vestido e me libertar aos pouquinhos. Comecei expressando as minhas opiniões, sem me importar com o que pensariam. Já falavam mesmo de mim, que agora tivessem um motivo.

O que uma garota de 20 anos pode saber sobre a vida? P* nenhuma, eu diria.

Mas a vida faz questão de me mostrar os sinais de que estou no caminho certo. Perdi a conta dos sorrisos e conto nos dedos as lágrimas que gastei nesse meio tempo. Não é fácil admitir certas coisas, mas é necessário. Tudo fica menos complicado quando encontramos alguém que se importa verdadeiramente com a gente. É difícil, mas não impossível. Encontrei pessoas raríssimas que agem como dizem e andaram me ensinando um bocado de coisa.

Por isso, meu bem, você estava errado. Redondamente errado. Todos nós vivemos numa bolha (até mesmo você) e nem sempre podemos controlar a direção do vento, mas ao enxergamos de uma outra perspectiva o trajeto e quem escolhemos para estar ao nosso lado, isso sim, faz diferença no desempenho da nossa tarefa. Aprendemos a ser leve e isso se reflete em nossos gestos, palavras, atitudes, valores.

E, acredite, assim vamos longe.

Belinda Oliver
Enviado por Belinda Oliver em 24/08/2016
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