O nome do vício

Rosa Pena


Ontem o telefone tocou num momento em que eu estava pensando se não estaria praticando o automatismo virtual.Comecei este questionamento há um mês.
Ligar o computador é como escovar os dentes, tomar café da manhã.Até ai acho razoável.
Escrever um poema seria como frear o carro num sinal?Automático? Acho que não, apesar de adorar escrever, isto não é igual a comer.Afinal, qual é a importância tão vital para mim neste mundo virtual? Escrever e ler tem que acontecer todos os dias?

Quando atendi ao telefone veio àquela voz carinhosa que sempre me delicia.Minha amiga virtual há mais de três anos estava no Rio de Janeiro.
- Vim pra te ver! Vamos para a Modern Sound?
- Sim, hoje, já, now!
Cheguei perto das 15 horas.Um pianista tocava baixinho Tom Jobim, e eu olhei as mesas.Nos conhecíamos de poucas fotos e voz, nos conhecíamos muito de alma!
Olhei as mesas e vi em algumas, mulheres sozinhas.Uma estava de costas escrevendo num papel.Fui direto nesta, não sei se por estar com a caneta, sua amiga inseparável, ou se bem lá no fundo, a vida inteira eu já a conhecia até de costas!
Cheguei perto e ela se levantou.Um abraço demorado de tão esperado que foi.
Conversamos muitas horas, que foram muito poucas perto do que queríamos.
O piano ao fundo era a formatação da poesia que existe entre nós.
Ontem redescobri que meu automatismo virtual é vício.
Amor vicia.
O nome do vício é Maria da Graça Almeida.

4 de março de 2005

Rosa Pena
Enviado por Rosa Pena em 05/03/2005
Reeditado em 18/10/2008
Código do texto: T5736
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