O Coveiro letrado

Um coveiro, certo dia se deparou com uma autoridade política no cemitério. O simples homem afligido com a sua situação fazia o seu trabalho com muito pesar. O político disse em um tom autocrata:

- Rapaz porque está trabalhando com tanta dificuldade? Agradeça por estar empregado!

O coveiro respondeu com uma poesia incomum:

Neste estágio podrômico da vida

nada mais resta que enterrar amigos lesados

Uns que foram violados e marginalizados

Outros de tanta labuta tornaram-se suicidas.

Ah! Um urubu pousou na minha sorte!

Sinto o chocalho fatídico dos ossos!

Em sintonia com o meu mar de remorsos

Por me deparar diariamente com a morte.

Podes sentir na pele os caroços

Aludem à perenidade de teus esforços

E jaz em cama brasida...

Agora, acostuma-te à lama que te espera!

Poderias resguardar-te, mas não é quimera

Por isso não enxergarás o colorido da vida...

O político calou-se por um tempo, pois estava atônito.

Passado um instante, ainda com a garganta meio que encadeada disse:

- Para um coveiro você até que fala bem eim?

Respondeu o homem:

- Lá no Pernambuco eu fui “alfabetzado” com o livro do Augusto dos Anjos vice!

Anderson Abraão
Enviado por Anderson Abraão em 20/08/2016
Código do texto: T5734220
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