TAM (o outro lado da tragédia)
Até hoje, vários dias após o acidente, estou recebendo muitas mensagens indignadas com o ocorrido com o avião da TAM, por isso, te convido a refletir comigo.
Tenho viajado muito, ultimamente e, em todas as vezes em que voltei a São Paulo, me vi em apuros na hora da aterrissagem. Não houve um único vôo em que conseguíssemos aterrissar na primeira tentativa, a aterrissagem só ocorria após mais de três tentativas de descida e após um mínimo de quarenta minutos sobrevoando São Paulo e isso independia de tempo, condições de pista ou qualquer outro fator. Isso quando não éramos obrigados a descer em Cumbica, sendo que a programação era para descida em Congonhas.
Cheguei a escrever a alguns amigos jornalistas e pedir que publicassem algo sobre isso, que alertassem para o grande risco que todos corriam já que, a qualquer momento, um avião poderia se desgovernar e se chocar em algum prédio ou algo assim. Alguns amigos até tentaram, publicaram notas e comentários, porém de nada adiantou e o caos continuou.
Enfim, o que já se previa, aconteceu. O avião que, segundo se divulga amplamente, tinha problemas no reversor da turbina direita desde a última sexta, dia 13 e já tinha tido problemas para aterrissar um dia antes. Mas, divulga-se também que, “os manuais de uso do Airbus A320 permitiam que o equipamento fosse desligado e que o avião continuasse a operar por até dez dias“. Levando-se em conta que o reversor é um "mecanismo que se abre como um guarda-chuva atrás da turbina, invertendo a direção do ar, por isso ajuda a diminuir a velocidade do avião nas aterrissagens" será que é possível usar um avião por dez dias sem pensar na hipotese de que ele possa não frear a tempo de realizar um pouso? Será que a pista tem a ver com isso? Ou será que é tudo isso e muito mais?
O resumo disso é que, diante dos “relaxa e goza”, de outras declarações descabidas citando a grande segurança do nosso sistema aéreo, as medidas de emergência que só ficaram na “intenção”, repetidas exaustivamente sem, no entanto, partirem para a prática, o único político que morreu neste vôo foi justamente um dos que mais criticavam o governo Lula e a crise aérea, o deputado Julio Redecker (PSDB-RS).
A partir daí, surgem os revoltados criticando o governo, os espiritualizados explicando os karmas de nossos irmãozinhos que passaram pelo desencarne e o grande trabalho do plano espiritual no “resgate” das almas e eu pergunto:
Afinal, qual é o sentido disso tudo? Tudo bem que, politicamente, um deputado que critica muito o governo pode ser convidado a calar-se viajando num vôo condenado, que, como sempre, tenha-se programado uma tragédia logo após a euforia, ou seja, a alegria do PAN e o acidente da TAM (a rima não foi proposital) ou até que se leve a sério os comentários sobre licitação de trens e outros motivos que poderiam justificar uma “crise aérea” condenada ao descaso. Porém, não há dúvidas de que tudo o que ocorre nesta dimensão é apenas parte de acontecimentos que atravessam dimensões, coincidência demais um avião da TAM chocar-se contra o prédio da própria TAM, coincidência demais um dos poucos políticos contrários a esta baderna perder a vida enquanto os foliões continuam festejando.
E, indo além disso, coincidência demais que, sempre que alguém é vitima de bala perdida (para mim é bala achada, se fosse perdida não acertaria ninguém), pois bem sempre que há uma vitima de bala perdida, é uma criança que saiu para comprar doces, ou o filho (marido, irmão) bonzinho que vivia para trabalhar e rezar e, de repente, acha a bala perdida. E a mãe (esposa, irmã) aparece toda descabelada gritando que “ele era um santo, um amor de pessoa, ajudava todo mundo, não merecia isso” e o povo entoa o cântico “justiça, queremos justiça”
Recentemente, um amigo muito querido que vive mesmo para ajudar a todos me escreveu um e-mail desesperado, dizendo que foi assaltado, amordaçado e pedindo que eu rezasse por ele. Foi a última noticia que tive dele...
Então eu questiono: qual é o critério desta justiça? Afinal, esta força que nos rege (cada um que chame como quiser) baseia-se em quê para “resgatar” ou condenar alguém a morte, ao sofrimento, a humilhação? Será que há uma regra básica, ser bonzinho, para ser “resgatado”, humilhado, sofrer e/ou partir para o desencarne? Será que há uma orquestra de bonzinhos tocando harpa no céu ou sei lá onde as pessoas acham que os mortos vão parar? Ou será que nós não percebemos que os mauzinhos também morrem, com a diferença de que morrem exercendo tanta maldade que acabam tendo suas mortes festejadas e, logo esquecidas.
E ainda têm os polêmicos que, como eu, sofrem inúmeros acidentes, se arrebentam todos mas continuam vivos para ficar agitando. E, no final, a grande verdade é que, cedo ou tarde, com violência ou dormindo docemente, todos nós morreremos e, ao contrário do que muitos querem acreditar, não vamos nos encontrar em lugar algum. Nem haverá um ser (ou grupo de seres) iluminado nos aguardando para nos encaminhar, docemente, aos braços do pai celestial. Cada um tem um nível de amadurecimento, cada um tem um caminho percorrido, cada um tem um grau de amor, de entendimento, de energia, enfim, cada ser é único e, ao sair desta dimensão, cada um seguirá seu próprio caminho. Encontrar alguém que amamos é mais difícil do que encontrar alguém com quem criamos alguma mácula. Creiam ou não, os encontros em outras dimensões acabam sendo com quem deixamos assuntos pendentes, amores não resolvidos, discussões, ameaças, enfim, da mesma forma que a vida tenta nos aproximar de quem não gostamos ou temos assuntos pendentes, a morte também o faz e, resumindo, se não resolvermos em vida, teremos que resolver na morte. Portanto, vamos dar o dedinho (no bom sentido) e fazer as pazes com quem odiamos, assim nos livramos logo do chato e não teremos mais que vê-lo quando formos “desta para melhor” E vamos também cultivar nossas boas relações, dar real felicidade a quem amamos, aqui e agora, pois não teremos nova chance quando morrermos. Não haverá reencontros, nem possibilidade de consertar erros que não consertamos e, muito menos, viver situações que adiamos em vida...
Como posso saber disso tudo? Porque já bati de frente com a morte por varias vezes, desde os oito meses de idade quando sofri o primeiro acidente aéreo que culminou com a explosão do avião (logo após a saída de meu pai que ficou por último resgatando as vitimas) até hoje, perdi a conta de quantas vezes fui a outras dimensões e voltei...
Bem, já falei demais e esta crônica é como aquela carta de amor que não deve ser escrita pois, ao invés de atrair, acaba repelindo o ser amado...
Lou de Olivier - Psicopedagoga, Multiterapeuta, Dramaturga, Escritora
Site oficial: www.loudeolivier.com.br