Meu Filho

Quando a gente tem um problema, por mais que pareça difícil, impossível ou cabeludo o negócio é encarar e não ter medo da fera, porque o final da nossa própria história muitas vezes depende dessa força de dentro pra fora.

Artur era um SESSENTÃO muito bem conservado, proprietário antigo de um restaurante no centro da cidade e não tinha tempo pra fricotes com a família. Durante a semana trabalhava até tarde, depois vinha a sauna, o joguinho de tênis e a namoradinha de vinte anos que acabava com sua saúde.

Os dois filhos não lhe davam despesas extras, porque o mais velho morava em outro país com a tia e Ismael, de quinze anos, só vivia entocado por aí.

Para ele, o mais importante era a geladeira repleta de bobeiras, compras no Shopping e o carro do ano. Tudo que pudesse ser imediatamente comprado com um cartão de crédito, mas Ismael queria muito mais. Queria um tempo para os dois, um bate-papo antes de dormir ou até mesmo uma partida de futebol no fundo do quintal. E isto tudo Artur não tinha para lhe dar...

Artur poderia comprar uma dúzia de bolas, se quisesse, e uma conversa furada, qualquer computador moderno poderia lhe oferecer, sem que precisasse faltar aos seus compromissos importantes.

Foi quando Ismael começou a ficar estranho, rebelde e cheio de mistérios. Fazia de tudo para chamar a atenção; só andava com um canivete na meia e agora ele se dizia ocupado demais para ficar em casa. Arrumou uma turma da pesada e descobriu que o pai tava por fora. E aproveitando esses desencontros entre Artur e Ismael, aquele menino que parecia tão perdido, foi achado por um sujeito malandro que lhe apresentou para o mundo das drogas.

Quando Ismael conseguia abrir a porta do quarto e se derretia no chão com os olho vermelhos, não se sentia mais desamparado como antes, porque ali estava embrulhado o pó mágico que tinha o poder de colorir o seu mundo. Começou como uma brincadeira boba e foi se tornando uma doença. Um vício que destrói a própria dignidade, deixando Ismael desnorteado, triste e cada vez mais sozinho.

Depois com lágrimas coladas na boca trêmula jurava para si mesmo que seria a última vez, só que seu corpo pedia mais e ele fazia de tudo para saciar esta fome danada de ruim! Já não sentia vergonha em vender o relógio, o tênis, a calça de marca...

E sentia muita saudade do pai, sempre bonito e em boa forma, que percebia suas olheiras profundas, seu corpinho seco, o seu rosto apagado... sem fazer nada! Preferia observar tudo através do vão da porta do quarto fingindo que não era seu filho. Que não era o pequeno Ismael que estava ali precisando de uma força para sair daquele abismo.

Durante meses Artur não falou sobre isto. Então foi se afastando de uma vez do problema, morrendo de medo de encarar Ismael de frente, mas numa madrugada qualquer, dessas que apenas dava uma passadinha em casa para fazer as malas, Artur ouviu um choro forte que vinha do quarto de Ismael. Era impossível fingir mais um minuto. Não tinha como se fazer de cego, surdo e mudo. Percebeu que Ismael estava assustado sentindo muito mais medo do que ele próprio. Então Artur respirou fundo, jogou as malas num canto e gritando por seu nome abraçou Ismael muito forte, prometendo que não o deixaria nunca mais, porque na verdade era um choro de criança que só queria um colo de PAI.