MEU PAI
(Trecho do livro Histórias de Jorge, o Batuta: nesta parte eu mostro o comportamento dele, numa das poucas vezes em que escrevemos juntos páginas do seu livro. Menos de cinco meses depois ele nos deixou para sempre).


Brasília, 22 de agosto de 2006
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Impaciente, incapaz de permanecer sentado por muito tempo, durante o trabalho de preparação do livro, ele se levanta muitas vezes para ir ao banheiro, emociona-se com as próprias palavras, perde-se entre um e outro relato, não consegue dar uma sequência cronológica aos fatos e repete algumas histórias que mais o marcaram.

Peço tempo, desligo o computador e o convido para um café lá na copa.
 - Tá bom.
Desce as escadas em disparada.
Em uma dessas oportunidades, ele resolveu dar uma olhada de perto na horta. Abri o portão e me distraí com afazeres dentro de casa. Quando dei por mim, já havia passado do horário do seu remédio. Fui chamá-lo, mas não o encontrei. Caminhei de um lado para outro na Quadra, procurando por ele e nada. Apreensiva, comecei a perguntar aos vizinhos e transeuntes se o haviam visto, até que um pintor de paredes, conhecido por Demacol, informou-me:
- Sei quem é o seu pai. Ele “tá” sentado na varanda da casa do Célio. Os dois “tão” conversando bem animados.
Fui até lá “pisando duro”, cumprimentei o Célio, que conhecia de vista, desculpei-me em nome do papai e o repreendi:
- Como é que o senhor sai assim, sem me avisar? Fiquei muito preocupada. Precisamos ir para casa, porque já passou- e muito - do horário do seu remédio.
Ele ignorou minhas reclamações e, apontando para seu anfitrião, disse calmamente:
- Você sabia que este rapaz foi seu colega de trabalho durante muitos anos?
Mudamos de assunto e, em poucos minutos, estávamos íntimos, porque de fato havíamos trabalhado simultaneamente no mesmo Órgão público, mas em setores diferentes.
Célio sugeriu que eu fosse buscar o remédio do papai, porque...” as histórias dele são tão interessantes que eu gostaria de desfrutar mais um pouco da sua companhia.”
Papai sorriu orgulhoso e me ordenou: “Vá lá buscar meu remédio”. Depois se dirigiu ao Célio como se aquela interrupção não houvesse acontecido e disse:
- Certa vez, eu estava fazendo uma viagem a cavalo...
Há dias em que ele está assim, completamente lúcido, com excelente raciocínio e bem humorado. Eu me sinto muito feliz nessas situações e aproveito para aconselhar-me com ele. Percebo benefícios maravilhosos que só a sua longa experiência de vida e suas frases filosóficas podem fornecer-me.
“Ninguém deve ficar parado. Enferruja. Engorda que nem capado”.
“Em terra bem adubada, praga não vinga”!
“Coisa boa é família unida”.

“O sujeito tem que ser honesto; deu a palavra, cabô”.
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Bsb, 13/08/2016 
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Sandra Fayad Bsb
Enviado por Sandra Fayad Bsb em 13/08/2016
Reeditado em 14/04/2017
Código do texto: T5727710
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