Os tempos da Festa das Neves
A primeira “festa das neves” que eu vi foi em Pilar; sem rodas gigantes, com carrossel empurrado pelo dono, girando em torno de um jovem sanfoneiro. Preferia esse divertimento à canoa, que dava frio na barriga, com suas subidas e descidas bruscas, levando o estômago pra perto da boca. Maior atração ainda era a chegada das enormes pedras de gelo, trazidas da capital pela “sopa” de Itabaiana; enroladas em estopa e pó de serra, para, à noite, esfriarem as bebidas da festa. Era privilégio tocar aquelas pedras ou experimentar sua raspa em refrescos coloridos. Isso foi lembrado pelo filme, de Werner Herzog, onde "Fritzcarraldo", assim chamado pelos nativos, fabrica enormes gelos, trocando-os por ouro e pelo trabalho escravo para os índios desfrutarem, temporariamente, essas esquisitas lajes frias contra o calor.
Via-se a magia nas bolas de festa, misteriosamente, voando pelas nuvens, céus adentro. A magia desapareceu quando, o vendedor de bolas foi visto misturando ácido sulfúrico com o zinco dos vazios tubos de pasta dental, encontrados pelo chão das ruas de barro, para obter hidrogênio.
A segunda maior quermesse, em Itabaiana. Os balanços e os carrosséis tinham avançado, interessando a adultos. Maior também o “pavilhão”, onde se leiloavam de galetos a carneiros. Enfileiravam-se barracas, roletas, tiro ao alvo, casinhas de coelho, pirâmides de latas derrubadas por bolas de meia e até homem que virava macaco. Então descobri na quermesse conquistas amorosas, troca de bilhetes, piscar de olhos ou furtivo “flirt”; livro de ouro para pintar , tirar goteiras da Igreja ou consertar o sino rachado. Em 1959, na Rua General Osório e adjacências, da pompa à “bagaceira”, conheci a verdadeira Festa das Neves. Cabiam dentro dela as do interior. As crianças de hoje não saberão contar a Festa das Neves do seu tempo; preferirão o shopping à festa de rua, como consumo fosse coisa da meninice.