Estranha velhinha

Todo o santo dia, em meio aquele monte de veículos grandes, lá vinha aquela lambreta. Até aí tudo bem, não fosse ela dirigida por uma senhora com bastante idade e carregando um baita saco no bagageiro. O pessoal da alfândega – tudo malandro velho – começou a desconfiar.

Um dia, um dos fiscais mandou-a parar e lhe perguntou:

- Escuta aqui, vovozinha, a senhora passa por aqui todo o dia com esse saco aí atrás. Que diabo a senhora leva nesse saco?

- Laranjas, seu guarda! Sabe, na minha idade é preciso ter uma boa alimentação. Meu médico sugeriu que eu ingerisse bastante líquido e eu confesso - to ficando viciada em suco de laranja. Além de ser gostoso, tem evitado certas gripes que me faziam andar todo o dia com o nariz escorrendo. Mas me diga, seu guarda: Não é crime, buscar essas poucas laranjinhas dos hermanos, né? São bem doces e com bastante suco.

- Deixa pra lá, disse o fiscal. Certo não é, mas como a senhora mesmo declara ser pouca coisa e é pra melhorar sua saúde, não sou eu quem vai prejudicá-la. Só não conte para ninguém que conversamos a respeito.

E assim continuou a velhinha a passar com sua lambreta e o conhecido saco de laranjas pela aduana, sempre sob o olhar suspeito dos fiscais. Claro que com o tempo a frequência de suas viagens tornou-se um pouco menor – já não eram todos os dias, assim como a aparência da velhinha também mudou, a cada dia mostrava-se mais elegante.

Num certo dia os fiscais deram falta daquela presença marcante. A velhinha havia sumido. Houve inclusive quem dissesse que ela teria morrido, afinal, já tinha bastante idade e aquelas viagens de lambreta talvez lhe tivessem prejudicado a saúde. Cada lambreta que aparecia era motivo de alvoroço, na vinda é claro, visto que, como em toda aduana, só é fiscalizado o veículo quando entra no país – quando sai não é notado.

Passado algum tempo, para espanto geral e muita satisfação, numa das abordagens de rotina encontraram na direção de um carro a velha senhora com seu saco de laranjas no porta malas. Notando o apreço que lhe dedicaram, fez a velha senhora questão de descer do carro para abraçar aqueles que estavam mais perto, momento em que, sem perceber, deixou cair sua carteira com os documentos.

Imediatamente um dos fiscais recolheu a carteira do chão e, ainda que tenha perdido de vista o carro da velhinha, tratou de tocar para a cidade que constava nos documentos, era próxima. Lá chegando, ainda na entrada da cidade, perguntou num posto de combustíveis, desses que sabem de tudo, se conheciam uma senhora que costumava passear de lambreta. Imediatamente, em uníssono, foi-lhe dito:

- Claro! Quem não a conhece.

- Siga sempre por esta rua e encontrará uma revenda de “lambretas” que a ela pertence. São veículos importados de ótima qualidade, e seu conceito no ramo é tão bom que está aumentando o negócio. Ao lado, está abrindo uma outra revenda, agora de automóveis.

- Aproveite, e mesmo que não faça negócio, prove o suco de laranja. É cortesia da casa.