TELA EM BRANCO
Uma tela. Em branco. Um desenho. Somente traços básicos. Um pincel que ao se lambuzar na tinta a óleo vai dando formato aos poucos traços do desenho. Um caminho, algumas montanhas, várias árvores, uma pequena casa. O colorido faz surgir a imagem que toma vida na tela em branco. Um campo, um riacho, um casario antigo ao fundo, árvores ao redor. Nova imagem. Outra paisagem.
Nova tela, também em branco. Novos traços de desenho. Dessa vez um vaso. Flores. Lilases, roxas, alaranjadas. Uma combinação de cores que se entremeiam e transformam o branco da tela num vivaz arranjo floral que atrai os olhares, que encanta a vista de muitos.
As flores se multiplicam. São orquídeas. Lilases e azuladas. Juntadas num ramalhete. Envolvidas em folhas verdes. Que dão vida a uma tela em branco. Outras flores. Azaleias vermelhas que preenchem o espaço de um vaso. E que adornam o espaço vazio de uma tela.
É no prazer de fazer surgir imagens coloridas que se instala a vontade de pintar. É um dom, dizem alguns. É um talento, dizem outros. A verdade é que pode ser um pouco dos dois e de outros elementos juntos. O desejo de expressar a atração pela beleza das imagens que preenchem a vida, as revistas, as redes sociais. E tornar perene essa imagem que agrada, que cativa.
Se observar com olhos apurados, com a delicadeza da alma, é possível ver os encantos de tantas coisas que nos cerca. As ruas onde andamos, os parques onde caminhamos, as casas que visitamos, os prédios que preenchem os espaços urbanos, as lojas enfeitadas que apelam ao consumo. Em todos esses lugares o formoso está presente, mas os olhos que enxergam a exuberância da natureza, a grandiosidades em várias obras do homem não são olhos comuns. São sensíveis, observadores e captam nos pequenos detalhes, assim como no todo, o significado escondido de algo que se projeta em uma garbosidade irreconhecível para tantos olhares.
A pintura não é incorpórea. É assentada em um cavalete com pincéis e tubos de tintas ao seu redor. É tangível. Transforma um conceito de beleza em um objeto palpável.
E no tempo dedicado à pintura encontro meu momento de expressão planejada daquilo que agrada aos meus olhos, que me agrada. Que me faz parar para observar atentamente e desejar reproduzir na superfície branca de uma tela.
A figura que se projeta perante meus olhos vai de encontro ao sentimento interno de apreciação, de preferência. E na análise atenta que direciona minhas mãos para os traços corretos, que posiciona meus pincéis, que sugere a escolha das tintas, que impõe a mistura propícia, faz surgir um novo matiz que transforma a figura que vejo na imagem que pinto.
Este momento de criação individual, que não precisa acontecer no silêncio e no isolamento, divide espaço com outras pessoas que expressam seu dom de pintar de formas diferentes, com colorido diverso. Mas com o mesmo pensamento: trazer à tona seus sentimentos internos de apreciação da beleza em suas mais diferentes e estranhas concepções.
Eu pinto para expressar tudo isto, sinto e traduzo com as minhas pinceladas, não a realidade comum, mas o cerne que uma imagem contém. Você percebe as nuances de beleza que o ambiente que o cerca oferece? Expressa esta percepção? Em uma tela em branco? Em um papel em branco? Em que ? Diga-me, em que?