SÓS
ARREGANHARAM-SE AS PORTAS e o sopro da extinção tomou conta de todos os cômodos. A solidão invadiu a fortaleza onde morreram todos os parentes. E o mais profundo desgosto se alojou no coração do homem.
Um castiçal sustentava a luz que guiava o caminho. A vida passou a ser impossível. E, então, o homem definhou. O abalo só não rompeu com o silêncio. Um tinha o outro. E, assim, seguiram untados; adivinhos de si mesmos; exemplos de amizades ancestrais; elementos de marchas duradouras. Por mais desapiedado... - Era isso mesmo. Até que a vela foi a frações de cerúmen. Fez-se treva. Não era mais um isolamento, mas a agonia da morte.
A vida foi reeditada em dois atos: reabriria as covas desse mundo aflito, para que as almas reclusas fossem aonde bem quisessem. E como segunda intenção: após o dia mais admirável da existência, e só depois do último minuto vencido, todos os viventes fechariam os olhos no sono do não mais existir. Assim, não haveria saudade.
Porém, o homem não era Deus.
Talvez admitisse a renúncia da sua vida moribunda... - Pela glória cerceada da amizade apetecida. O que teria para dar senão o resto de seus dias? Então, perdido na mais profunda escuridão, fizesse dia ou noite, proferiu em tom de conformismo:
- Continuarei desprovido da claridade; livre de pensamentos; e na penumbra admitirei apenas a indiferença. Não me darei direito ao sonho. Arrancarei as unhas nas paredes da prisão e chamarei pela morte. E, assim, no dia da efusão, cujo fenecer nivelará a todos, elegerei a loucura a segurar-me a mão. Não deixarei, feito herança, há quem por ventura, reclame o meu perdão, a desgraça que foi a minha impagável desgraça. Serei enterrado em vala de indigentes e como mantimento dos bichos, em retribuição. Não haverá cruz. Apenas a insignificância de meus tempos irá confortar-me. Não fui digno de enterrar todos os meus amores.