As Mentiras do Pós-moderno
 
Na área do “Posto de Gasolina” letras garrafais obrigavam a todos que iam abastecer seus carros ou o pedestre que passava a olhar para o painel  exposto de forma central: “Verificamos Gratuitamente os Amortecedores de seu Veículo”.
 
Qualquer um que não fosse tolo poderia concluir que aquilo era uma armadilha para levar o freguês a verificar o proposto. Certamente, por tratar de um estabelecimento comercial, daria o diagnóstico sem que o cliente consultasse os estabelecimentos concorrentes, dada a comodidade e ilusão da oferta:
- Os amortecedores estão danificados e precisam ser trocados!
 
Dias antes eu já havia sido posto à prova. A conta de meu celular ia vencer no dia seguinte e a neurose fazia a voz materna gritar: “Não quer ter amolação pague suas contas adiantadas”. Para calar a loucura procurei a operadora e disse que precisava de uma segunda via.  A recepcionista foi prestativa:
- Vou imprimir uma para o senhor... Estou verificando aqui que o senhor é cliente antigo. Temos vantagens a lhe oferecer: isto e aquilo por tanto. Ao que eu respondi:
- Moça, eu só uso o celular para ocasionalmente falar com meu filho que mora sob o mesmo teto que eu.
- Mas o senhor vai ter blábláblá e blublublu.
- Não importa moça. Eu só quero é pagar a minha conta antecipadamente!
- Não acredito que o senhor vai deixar passar esta oportunidade de...
Eu interrompi já irritado:
- Moça, que oportunidade? Você quer que eu contrate serviços que eu nunca eu irei usar?! E, além disto, você está dizendo que eu vou pagar duas vezes mais o que eu já pago e acho um absurdo! Eu sou de um tempo em que a casa que tinha uma única linha telefônica era um luxo! E eu não consigo entender estes compulsivos e obsessivos que ficam falando, falando, falando e falando feitos loucos para cima e para baixo pelas ruas e aonde quer que se vá.
Venci.
Eu saí apenas com a segunda via da conta.
 
Dias depois entrei em um restaurante para tomar um café a fim de fazer hora: queria apenas matar o tempo para esperar um compromisso.
 
Não demorou e o garçom veio com o papo blebleble:
- O café é de graça! Mas para o senhor exercer a gentileza o senhor pode deixar um cafezinho pago para outra pessoa como o senhor está recebendo este. E arrematou com o chavão feicebuqueano:   “Gentileza gera Gentileza!” E fez aquela cara de paisagem como se estivesse pronunciado a maior máxima do universo.
 
Conversa fiada!
Mentira deslavada!
Pois se eu comovido e coagido a deixar um café pago eu na realidade estou pagando aquilo que consumi.
E mais a mais se gentileza gera gentileza, o burguês proprietário do restaurante que pague para o necessitado e não venha usar o meu chapéu para fazer mesuras e posar de santo. Ele é dono de um meio de prestação de serviço, lucra por isto e eu apenas um aviltado professor público que tive que vender meu saber para sobreviver... e ainda tinha que ouvir:
- O magistério é um sacerdócio, uma doação para o outro. Ora, pois!
 

Mentiras do romantismo falido que se revestiu de pós-modernidade.
 


Leonardo Lisbôa,
Barbacena, 17/07/2016.
   
 
 

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Leonardo Lisbôa
Enviado por Leonardo Lisbôa em 23/07/2016
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