PÊNDULOS
“Lá vai Zezinho,
montado em seu cavalinho
como corre o cavalinho
corre, corre cavalinho,
não tropeça com Zezinho.”
Esse era o texto de capa da cartilha já meio esfarrapada pela qual fui alfabetizado, ilustrado por um menino chamado de “Zezinho” montado em um cavalinho de madeira sobre uma prancha encanoada, idêntica às das cadeiras de balanço, propiciando o movimento do galope. Meio esfarrapada porque éramos três irmãos e, nos anos cinquenta, os livros passavam de irmão para irmão, sendo eu o menor. Tinha outros textos, como “vovó viu a uva” e “o ovo é da vovó”, mas o “Zezinho” era meu xará. Creio ter sido meu primeiro enfrentamento entre a emoção do desejo de cavalgar no cavalinho e a razão de aprender a juntar as letras. Percebi, depois, nos meus relacionamentos diversos, que essa é a maior batalha que travamos na vida. Razão e emoção. Dois planetas de galáxias diferentes disputando o mesmo lugar na nossa mente, comandados pelo pêndulo de um imaginário relógio. Ninguém é todo emoção ou todo razão. Não raramente, a emoção nos faz perder a razão e a razão nos tira a emoção de um momento irrecuperável, inenarrável, breve e raro. Lá, na cartilha, segui a razão, senão não escreveria esse texto agora. Mas tenho preferido seguir o coração, escolha causadora de alguns sofrimentos, compensados com sobejos pela emoção de ser “Zezinho” e estar sempre galopando à sorte do vento, naquele cavalinho.