"A RUA DO MEIO"
Passos no corredor. Há cruzes nas portas. Uma lua suspensa. Janelas em desalinho. Falsos jardins em parapeitos. É o caos no arranjo das flores. Varais colorem a ambiência. Paredes que parecem se estreitar. A fisionomia do beco é de angústia. Não há silêncio no beco. As suas entranhas falam. Beco de quebrantos, sentidos paralisados, roleta da sorte, vai-e-vem da maldade. Vez por outra um enforcamento. Ditar o beco é comê-lo. O beco desafia a topografia de tudo que é intrincado. A "rua do meio" não é um beco qualquer, é uma cidade-gueto. Os moradores são artífices; e são ainda cúmplices. E isso é, também, altruísmo. A felicidade do beco é a alucinação. O banal é o tema único. Na "rua do meio", o que mais se faz é matar o tempo. Tudo conspira para o horror. É o beco nas páginas policiais. No beco só há o fim. Nada nasce no beco; as coisas morrem no beco. E o que sai do beco nunca foi parte. "A rua do meio" não é apenas uma rua de pontas: é uma confluência de exageros. É gente sobre gente. O espelho marginal da sociedade desnaturada. O beco é o abrigo preferido de quem tem medo. É no beco onde mora o grito. Há no beco a vida dentro da vida. No beco, não há esperança para o acaso. A "rua do meio" resiste à sua própria condição de beco, cujas esquinas nos remetem para o além-mundo. O beco é um escoadouro de sonhos; o ensaio de uma rebelião interior. Uma favelização de tudo que se move. O beco é um abuso. O tempo rasga o beco; e, na pulsação dos minutos, elege a sua rotina. E, outra vez, não há metades. A "rua do meio" é uma cadeia sem grades. Como culpar o beco? Imagino uma procissão de almas iluminando o lugar: "Bendito é o fruto do Vosso ventre..." - Ao homem, o seu beco.