CRÔNICAS HODIERNAS .
Um certo dia já nesta época de crise econômica nacional, estava eu fazendo compras em uma dessas lojas que vendem quase de tudo, de gêneros alimentícios a pneumáticos para automóveis, eis que de repente um casal, certamente cônjuges de meia idade,fazia anotações dos preços dos produtos expostos nas prateleiras (também chamadas de gôndolas). E , observei com máxima atenção e admiração a abnegação demonstrada por esse casal,pois, enquanto o homem lia as informações contidas nas etiquetas, repassando logo em seguida para a mulher,ela por sua vez comparava as tais informações com uma relação sobreposta e anexa por prendedores de papel a pedaços retangulares de papelão cortados ,cujos, imitavam uma prancheta e que a mesma carregava em suas mãos...Um verdadeiro trabalho de equipe !
Ansioso para puxar assunto com aquele casal e parabenizar pela iniciativa em pesquisar preços e controlar melhor o orçamento doméstico, eu acabei por perguntar ,desde quando eles(a mulher e o homem) estavam verificando os valores das mercadorias para ver se haviam promoções, ofertas ou no mínimo descontos, se foi depois que o Brasil mergulhou nesta crise econômica ou bem antes ? O casal muito simpático respondeu :
-Ah ! amigo, há muitos anos, décadas que nós fazemos esta tarefa quase que diariamente, somos trabalhadores oprimidos ,oriundos de usinas de açúcar e sabemos muito bem o que é contenção de gastos domésticos ! E continuou, me fazendo uma pergunta :
-O amigo, já ouviu falar de BARRACÃO de USINA , por acaso ?! Eu respondi : -Já, com certeza e ainda mais acrescento , que meu pai e meus avós paternos contavam que era um verdadeiro inferno, quando os moradores(trabalhadores e seus parentes), tinham a infelicidade de se deparar com um capataz de usineiro desonesto tomando conta do BARRACÃO DA USINA, pois, as pessoas pagavam por mercadorias que nem tinham comprado ou consumido e se essas pessoas se sentissem lesadas, pressupostamente, como vocês mesmos sabem ,não é mesmo ? não adiantaria nem comentar com colegas de trabalhos ou vizinhos, pois, estariam sujeitos a severas retaliações,bastaria pra isso chegasse ao conhecimento do gerente da usina ou seus subalternos, e sabe-se bem que muitos deles eram verdadeiros CAPITÃES DO MATO,um dos castigos mais comum aplicado era demissão daquele trabalhador resmungão(para o usineiro era um infrator) e consequentemente expulsão de toda sua família da comunidade,melhor dizendo , da Propriedade Particular do Usineiro. E continuei , e se esse trabalhador e/ou sua família demonstrasse que não era religiosamente católico fosse, por exemplo, um praticante religioso da NOVA SEITA(que mesmo sendo, por essência , uma doutrina cristã, porém, não católica,por isso ela era chamada de RELIGIÃO DA 'NOVA SEITA' PROTESTANTE) poderia ter piores consequências . Imaginem se fosse um MUÇULMANO !
Inclusive, eu tenho até que narrar um episódio que se passou em uma dessas usinas que meus avós moraram por um bom período de tempo:
Eles contavam ,que teve uma família vizinha,cuja, tinha muitos filhos pra dar de comer e estava numa situação financeira apertada, foi aí que um dos cônjuges, teve uma ideia de não receber do administrador do BARRACÃO DA USINA, a porção de carne para o consumo da família ,que lhe era de direito, imaginando que não lhe fosse descontado da cota da 'ração'.
Chegando o dito cujo fim do mês , o caboclo foi surpreendido com o desconto no seu salário, referente ao consumo da carne de boi ,durante aquele período... Aquele trabalhador foi logo se irritando com o administrador do barracão, justificando que não pegou as porções de carne que era distribuídas semanalmente e não seria justo , se cobrar por uma mercadoria que ele não consumiu. O administrador do barracão , respondeu :
-Bem , você não quis receber suas porções de carne , a cada semana, entretanto, você e tudo mundo sabe que os BOIS FORAM MORTOS TODA SANTA SEMANA ! O problema é seu , amigo ...
O homem retrucando , me perguntou :
-Amigo, seus avós paternos , trabalharam em que usina ? Respondi:
-Ah ! em várias , tanto em Pernambuco , como no Estado da Paraíba, todavia, devo lembrar e ressaltar que não foram meus avós que trabalharam e sim o meu avô e sempre em funções metalúrgicas de serralheiro e caldeireiro, minha avó apenas e tão somente acompanhava como esposa do meu avó ! Foi aí que eu me senti no direito de lhe perguntar, onde eles (o homem e a mulher)trabalharam , eles me responderam : - Nós fomos empregados de uma usina aqui em Pernambuco, nos aposentamos lá , minha mulher trabalhava no escritório da usina e eu num barracão.