“VIVER É MORRER” DIZ SCHOPENHAUER

“O homem passa a vida inteira lutando por algo que acha que vai fazê-lo feliz. Não consegue e, quando consegue, fica desapontado: ele é um náufrago e chega ao porto de destino sem mastros nem cordames. Não interessa mais se ele foi feliz ou infeliz, pois a vida foi sempre apenas o presente, que estava sempre sumindo e agora terminou..”

LI ESSE AFORISMO DE Arthur Schopenhauer e tive a impressão de que meu corpo esfriava, a cada palavra vencida. Ao mesmo tempo em que o realismo me assustava, o pessimismo me comovia. Abdicar das coisas da vida é um convite bem estranho para se fazer a alguém. Muito embora, só assim, acreditava o filósofo, o homem poderia ser completo.

Viver é morrer, dizia ele. A perda é uma condição indelével. Viver é um sofrimento do princípio ao fim. Marchamos para o lugar de onde viemos: o mundo do esquecimento, o recôncavo mais denso, o nada. E, ensinava Schopenhauer, que o único caminho a transcorrer deveria ser o que nos levasse para dentro de nós mesmos. Condenava Platão, Sócrates e o cristianismo, por nos oferecerem uma vida abundante além-túmulo; uma coisa ilusória. Dizia que se perguntássemos aos espíritos, que descansam nos cemitérios, se eles queriam voltar à vida, a resposta seria não.

Influenciou Nietzsche e Freud; criticou Fichte e a mesma coisa aconteceu com Hegel, só que este último de forma mais agressiva. Fez de sua existência um isolamento; e garantiu que se bastava. Quanto menos vida pessoal, mais segura e melhor seria a vida intelectual. Chamava os humanos escrachadamente de bípedes. Raramente encontrava alguém que merecesse desperdiçar o seu tempo.

Expunha que as pessoas conservavam o hábito de não falar outra coisa senão sobre cavalos, cachorros e mulheres. O conhecimento é limitado, só a estupidez é ilimitada. O intrigante filósofo falava que deveríamos manter certa distância uns dos outros, e alegoricamente citava a fábula dos porcos-espinhos que se juntavam para se aquecer com o calor dos corpos; porém, quando viam que estavam se espetando se afastavam, ficando com frio de novo. Entre os dois males, terminaram por encontrar a distância correta.

Achava que para ser considerado, tinha que desconsiderar. E que não precisar de ninguém é predicado para se obter respeito. Nunca se importou com a opinião dos outros. Por suas ideias foi incompreendido, para não dizer ignorado. Arthur Schopenhauer tinha a certeza de que o bom escritor não servia para a sua geração, pois a mesma não merecia a contemporaneidade do gênio; estava nos anos vindouros, e dali em diante, o reconhecimento do seu legado.

Escancarou as portas da cultura oriental e nos apresentou as quatro verdades do budismo. O pai, que lhe queria comerciante de carreira, morreu após cometer suicídio. A própria mãe o mandou deixá-la em paz, pois já havia conhecido a clausura e, viúva, não queria um novo casamento, agora com o filho. A irmã, Schopenhauer quase não viu a vida toda. Escolheu a filosofia, ao invés de uma vida de celebração à própria vida. Reforçou a tese de que nada que vem do homem lhe causava estranheza.

Morreu de embolia pulmonar, já velho. Seu rosto não mostrava agonia de morte. Em sua lápide de granito, sobre o túmulo, consta apenas o seu nome e nada mais.